quarta-feira, 4 de novembro de 2020

Uma mulher é estuprada dentro de um recinto do Judiciário, diante de juiz e membro do MP. Isso pode? Seria isso um "estupro legal"?

Mariana Ferrer, 23 anos, a jovem que acusou o empresário André de Camargo Aranha de tê-la estuprado durante uma festa, em 2018, pode até não ter sido estuprada.

A falta de provas foi a alegação nuclear da sentença absolutória prolatada pelo juiz Rudson Marcos, da 3ª Vara Criminal de Florianópolis, onde o caso tramitou em primeira instância.

Mas, para um outro estupro, há provas - evidentes, clamorosas, fartas, plenas, insofismáveis, incontestáveis.

Mariana, se não foi estuprada durante a festa em 2018, foi estuprada num recinto do Poder Judiciário - no caso, a sala de audiências da 3ª Vara Criminal de Florianópolis. E foi estuprada diante do juiz que presidia a audiência e de um representante do Ministério Público.

Se estamos diante de uma tese que o The Intercept Brasil comparou ao que seria um "estupro culposo" - figura penal que, obviamente, inexiste -, seria demais dizer-se que o estupro cometido contra a moça, numa dependência do Judiciário, diante de juiz e promotor, foi um "estupro legal"?

Chegamos a esse ponto?

O estupro de Mariana foi configurado pela conduta - monstruosa, afrontosa, desumana, infame, nojenta, despudorada, cruel e machista - do advogado Cláudio Gastão da Rosa Filho, que defendia o réu e desqualificou a vítima.

Mariana, pelo que se pode ver no vídeo, foi vítima de um estupro verbal.

Foi vítima de um estupro moral.

Foi vítima de um desavergonhado estupro à sua honra.

O estuprador, no caso o advogado, excitou-se a esse ponto criminoso ao descontrolar-se no pleno exercício de um dos principais deveres que lhe conferem a profissão: o de representar dignamente seu cliente.

Dignamente, repito.

Nos ambientes em que exercem sua profissão - e o Judiciário é o ambiente por excelência onde isso ocorre -, advogados precisam, inelutável e inescapavelmente, observar e exigir que sejam observados seus direitos.

Mas não podem advogados, sob qualquer hipótese, sob qualquer justificativa, em nenhuma circunstância, desbordar para o achincalhe e exceder-se nas prerrogativas que o nobre exercício da advocacia lhes garante.

Está lá, registrado, preto no branco, no artigo 33, III, do Código de Ética e Disciplina (CED) da OAB, que o advogado deve abster-se de "abordar tema de modo a comprometer a dignidade da profissão e da instituição que o congrega".

Cláudio Gastão da Rosa Filho, ao praticar esse estupro verbal e moral contra uma mulher num recinto do Poder Judiciário, diante de um juiz e de representante do Ministério Público, comprometeu, aviltou, desvirtou, maculou, manchou, agrediu  violentamente a dignidade da profissão que ele exerce e da instituição que o congrega.

Consumado o estupro num recinto do Poder Judiciário, o que fez o juiz?

Avisou à vítima estuprada que poderia, se quisesse, sair dali e tomar um copo d'água para se recompor.

Céus!

A que ponto chegamos nesse show de horrores!

E a que ponto ainda haveremos de chegar?

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