quinta-feira, 25 de junho de 2020

A AGE age para apurar o caso do vale-alimentação. E várias perguntas precisam ser respondidas já. Sem polícia.

Via fechada em Belém, em protesto contra a recusa de supermercados em
receber o vale-alimentação. Aja, AGE. Aja agilmente. Aja já!

Cobrado de forma insistente – e em dimensões tsunâmicas – nas redes sociais, em decorrência da recusa de supermercados em receber o vale-alimentação distribuído pela Secretaria do Estado de Educação (Seduc) a milhares de estudantes da rede estadual de ensino, o governo do estado age. Age pela AGE.

A Auditoria Geral do Estado, sob a batuta do doutor Giusepp Mendes, anunciou que vai agir. A notícia, disponível na Agência Pará, você lê aqui.

Mendes é o mesmo que acionou as polícias Civil e Militar, na última segunda-feira (22), para fazer uma inédita busca e apreensão de documentos na repartição estadual, no caso a Secretaria de Justiça e Direitos Humanos.

Por que inédita? Porque, até onde sabemos, ainda não se tinha visto, pelo menos aqui no Pará, o governo acionar a polícia para buscar documentos do próprio governo. A AGE, presume-se, poderia simplesmente requisitar, formalmente, os documentos. Mas preferiu buscá-los em meio a um aparato policial. Por que essa opção? Sabe-se lá o porquê.

O que se sabe é que, neste caso do vale-alimentação, a AGE preferiu deixar a polícia de lado e, cautelarmente, já denunciou as empresas Meuvale Gestão Administrativa Ltda. e a Trivale Administrativa Ltda, que administram o vale-alimentação distribuído pela Secretaria do Estado de Educação (Seduc) a milhares de estudantes da rede estadual de ensino.

Ambas as empresas, diz a AGE, foram denunciadas ao Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores (Sicaf), que reúne prestadores de serviços a órgãos e entidades da administração pública, recomendando a suspensão delas em qualquer processo licitatório no País.

Até aqui, nada a reparar.

Mas há detalhes que chamam atenção. E por chamarem atenção, ensejam perguntas que, espera-se, haverão de ser respondidas claramente no curso da investigação agora iniciada.

Os detalhes que chamam atenção encontram-se nas explicações apresentadas pela Associação Paraense de Supermercados (Aspas) à AGE.

Em resumo, a Aspas diz que “a empresa Meuvale Gestão Administrativa Ltda, antes de firmar contrato com o governo do Estado, mantinha um número relativamente pequeno de supermercados e autosserviços como credenciados em sua rede de atendimento.”

Informa ainda a Aspas que, após a referida contratação, a empresa “buscou ampliar sua rede credenciada, todavia, taxa de administração ofertada (5% a 5,5%) se mostrou muito elevada em relação às praticadas por suas congêneres (2,0% a 3,0%), frustrando suas expectativas”.

Encerra a Aspas: “Alguns de nossos associados, que mantinham contratos firmados em suas datas anteriores, recentemente, deixaram de aceitar o cartão, em função de atraso ou ausência de valores que lhe são devidos”.

O que significa a informação da Aspas, de que a empresa mantinha um número relativamente pequeno de supermercados e autosserviços como credenciados em sua rede de atendimento?

Estamos aí diante de uma espantosa revelação – ou suposição, vá lá – de que a empresa não tinha a menor condição de prestar um serviço que foi contratado para beneficiar nada menos de 560 mil alunos, em 144 municípios, num estado de dimensões continentais como o Pará.

Diante desses pontos revelados pela Aspas, há muitas perguntas que precisam ser feitas.

Por exemplo:

  • No ato de contratação, aferiu-se de alguma forma o porte da empresa, para saber se poderia prestar os serviços para os quais foi contratada?
  • No ato de contratação, não havia qualquer indício do inadimplemento da empresa em relação às suas obrigações para com fornecedores?
  • No ato de contratação, se houve indício de que a empresa estava inadimplente, alguém buscou saber se a inadimplência poderia ter, como reflexo, a recusa de supermercados em receber o vale-alimentação?
  • Quanto à taxa de administração, não houve qualquer previsão contratual sobre um teto a ser respeitado, justamente para evitar que, numa relação direta com os comerciantes, fossem praticadas abusividades como as que agora a Aspas informou à AGE?
  • A AGE, espera-se, deve proceder a essa investigação rapidamente, até mesmo para que, obtendo o esclarecimento desses fatos, possa apontar uma solução urgente para minorar as dificuldades impostas a nada menos de meio milhão de estudantes.

E tudo isso, até prova em contrário, pode ser feito sem aparatos policiais, ainda que, eventualmente, venha a ser feita a responsabilização civil e penal de empresários que agora se mostram inadimplentes e não estão cumprindo obrigações contratuais assumidas.

3 comentários:

  1. Não consigo entender que não façam o crédito do mesmo valor do vale diretamente nas contas bancárias dos servidores, junto com os vencimentos. Simples assim. Pouparia milhões de reais que vai para a administradora e, quiçá, outro tanto que se perde nos meandros escuros de alguns corredores. Toda a administração federal já paga, há anos, o valor diretamente na conta. Não faze-lo, para mim caracteriza má fé. É como fazer ligações no orelhão usando aquelas fichas telefônicas. A ficha precisa cair. Haja modernidade e boa-fé. Aja governador!!

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  2. Francisco Sidou26/6/20 15:05

    O que mais espanta no episódio - mais um de descuidos com o dinheiro público - é a ausência total de mecanismos de prevenção de fraudes, caro PB. Suas perguntas são todas pertinentes, mas o que mais também espanta é a total ausência de "curiosidade" em saber de tais informações de parte das autoridades ditas competentes para ordenar despesas com o dinheiro público...
    Por que tanta "ingenuidade" em se deixar enganar ?

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  3. Ramon Bentes26/6/20 23:28

    Amigo Kenneth, a contratação foi feita para beneficiar os alunos da rede pública de ensino. Mas, ainda assim, concordo contigo. O crédito poderia ser feito diretamente em conta do aluno ou seu responsável. Ou ainda, a licitação prever a taxa de administração a ser descontada na intermediação com a rede de abastecimento. Simples, eu presumo.

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