segunda-feira, 8 de janeiro de 2018

A piada pronta terminou

SERGIO BARRA

Levou alguns minutos para que a notícia do indulto natalino não fizesse uma viagem de cruzeiro pelas casas de detenções e fosse rapidamente processada pela Procuradora-geral da República, Raquel Dodge, que usou de argumentos duros ao afirmar que o indulto estava fora da finalidade estabelecida na lei "é arbitrário" e escreveu que: "o chefe do Poder Executivo não tem poder ilimitado de conceder indulto. Se o tivesse, aniquilaria as condenações, subordinaria o Poder Judiciário, restabeleceria o arbítrio e extinguiria os mais basilares princípios que constituem a República Constitucional Brasileira". O Executivo achava que a história se resumia ao anúncio de enredo de alguma escola de samba para o desfile de 2018. E o que se pode pensar e imaginar de um presidente da República que foi professor de Direito Constitucional!
Já a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, afirmou que o indulto não é nem pode ser instrumento de impunidade e que o benefício não é "prêmio ao criminoso nem tolerância ao crime". Essa postura perante assunto sério e polêmico, como esse, dá realmente para acreditar que o discurso dela é a mais pura verdade. Foi fundamental esse entendimento jurídico. Cármen atendeu a todos os pedidos de Raquel Dodge ao suspender o indulto para quem cumprisse um quinto da pena; para quem teve a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos; quem esteja cumprindo a pena em regime aberto; quem tinha sido beneficiado com a suspensão condicional do processo; ou quem esteja em livramento condicional; para presos com pena de multa aplicada cumulativamente, que ainda têm inadimplência ou inscrição de débitos na Dívida Ativa da União e por último suspendeu o indulto para presos cuja sentença tenha transitado em julgado.
O céu (nem isso) é o limite. O indiscutível é que, com essa conduta do executivo, nada será como antes no que se refere à PGR e ao STF. A ordem das coisas nos últimos dias seria subvertida. E isso mudaria o futuro. Tempo do STF reconquistar a população e que a atitude dessas magistradas sejam as primeiras a destruir a primeira grande "teoria da conspiração". A população agradece. E, nesses casos, só a história pode trazer as respostas. Quem sabe venha do passado a resposta para o presente. Como sempre.
O povo brasileiro tem a mente aberta, sabe das coisas, é tolerante e quer entender como essas autoridades metem os pés pelas mãos de forma surpreendente e ousada. Dando a impressão que tudo podem como esse inacreditável indulto natalino proposto pelo governo. Isso atesta, inapelavelmente, a incompetência do Executivo. E eles pensam que isso seria um grande avanço. Pensando bem... O prejuízo sofrido pelo Estado e o medo generalizado da sofrida população que não consegue mais acreditar no governo que aí está.
Nada como um dia atrás do outro. O povo, que tinha uma admiração quase mística pelos ministros do STF, vem lamentando e, não é de hoje, que as luzes dos holofotes e a transmissão das sessões os fez "artistas de TV", antes das transmissões os debates eram muito técnicos e a vaidade estava adormecida. Agora, os debates são emotivos, com troca de agressões, parecendo sessão de Legislativo. Os ministros jogam para a "plateia", como os políticos, e priorizam o senso comum e não a Lei, e a troca de insultos substituíram discussões técnicas. É lamentável.
O STF, como instituição tem sido alvo fácil e seus ministros ficam expostos ao alcance da covardia das redes sociais. Num passado não muito distante a presidente Cármen Lúcia, o relator da Lava Jato, Luiz Fachin e Dias Toffoli, foram alvos. Agora, Gilmar Mendes, o mais criticado é a bola da vez. No Supremo tudo leva a crer que há uma crise de liderança. Alguns ministros precisam baixar a bola. Falta, como nos velhos tempos, um guardião a altura do Supremo. O STF precisa descartar-se dos holofotes aliciantes.

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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com

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