ISMAEL MORAES - Advogado
Twitter @ismaeladvogado
Dois princípios constitucionais são presentes a
toda hora no dia a dia da vida em sociedade organizada sob a autoridade estatal:
o da primazia do Poder Judiciário e o da Responsabilidade. Ambos garantem que
ninguém seja subtraído de julgamento e de responder por atos ou atividades a
que der causa no Estado de Direito.
A Constituição não prevê esfera em que ações ou
omissões fiquem imunes às autoridades judiciais ou com funções para julgar. Até
mesmo nas camadas de poder mais blindadas pela Constituição inexiste vácuo
salvaguardando de responsabilização a ponto de refugiar o detentor de
prerrogativas dos efeitos punitivos dos seus atos. Aliás, exemplar o processo
por que passa a presidente da República Dilma Rousseff. É excepcional, e é
talvez o que haja de mais absolutamente restrito no ordenamento jurídico
nacional, mas existe o processo de impeachment.
Quando os controladores do aplicativo WhtasApp
dizem-se incapazes de fornecer, interceptar ou resgatar dados poderiam ficar
isentos ao que estão submetidas a sociedade e as autoridades do Estado? A
alegação de resguardo da intimidade, do sigilo e da liberdade de comunicação é
bastante para eximir de responsabilização?
Tudo o que diferencia a inteligência
do homo sapiens dos outros animais é a sua capacidade de criar e
transmitir informações. A criação do ente Estado e de sistemas como a
Constituição é produto disso. Portanto, a base da identidade humana e a toda a
estrutura do complexo de suas relações vem do seu poder de se comunicar, que é
por onde se domina e se subjuga.
Portanto, talvez não haja bem mais importante a
ser tutelado pelo ordenamento jurídico que a responsabilização pelo uso das
informações e da comunicação.
A liberdade de expressão, de comunicação, de
produzir informações, livros, conhecimentos e transmiti-los, é irrestrita, até
que o sujeito não transgrida passando ao campo do que é considerado
crime. O julgamento do STF no Habeas Corpus nº82424 (caso do editor
Siegfried Ellwanger) indica os limites.
Por muito mais razão, a Constituição não
permite, mesmo em um Estado Liberal como o nosso, que o Estado de Direito
albergue uma zona insondável funcionando paralelamente à vida física, mas que
permita, por meio de informações, criar condições funcionais a delitos.
Como resumiu o juspenalista Nelson Hungria, “o
sigilo não protege o crime”. Se o aplicativo WhatsApp não possui os
instrumentos tecnológicos para entregar às autoridades do Poder Judiciário os
dados necessários a subsidiar a solução das violações de direito, então, talvez
não seja o caso de discutir meios de restringir o uso ou de punir o Facebook.
Talvez a Constituição tenha se tornado antiquada diante de um universo tipo
Matrix. Talvez não, e, em ela não estando defasada, quem sabe seja o caso de
avaliar se tecnologias como essa podem conviver no mesmo espaço do Estado de
Direito.
Onde estaria a liberdade, ou a melhor sensação
dela, sob o Estado ou na Matrix?
É só o magistrado determinar uma perícia de ofício para verificar a possibilidade de fornecimento dos dados. Se é que esta perícia é possível.
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