segunda-feira, 1 de junho de 2015

Educação autônoma e saudável


As últimas semanas no Brasil precisam ser olhadas de maneira diferenciada. Foram semanas marcadas por assassinatos e violências com requintes de crueldade. A grande maioria por menores, essa garotada que não tem lar e faz da rua seu mundo pessoal. Hoje, no mundo inteiro é assim. Em periferias ou áreas conflagradas, em guerras, as mortes recebem menos atenção do que os crimes em área turística, de lazer, buscada por nativos e estrangeiros. Por envolver menores de idade, esse crime obriga políticos e sociedade a examinar com lupa sua imagem no espelho. Falta, sobretudo, vontade política digna, que forme cidadãos e não bandidos. Falta planejamento familiar para evitar paternidade e maternidade aos 13, 14 ou 16 anos. Falta, na "pátria educadora", Educação com maiúscula, para todos e de qualidade em tempo integral.
Há quem faça investimento numa didática afetiva, cuja saída é estimular o autoconhecimento. Desenvolver teorias importantes sobre tipos de personalidades e comportamentos sociais. É assim que o psiquiatra e pesquisador chileno Claudio Naranjo (na foto) investe nessa linha para evitar que "a educação atual produza zumbis". Sua trajetória pode ser classificada como irrepreensível pelo mais ortodoxo dos avaliadores. Foi um dos indicados ao Nobel da Paz deste ano. Há mais de três décadas, ele e a fundação que leva seu nome pregam que os educadores devem ser mais amorosos, afetivos e acolhedores. Acredita que essa maneira, é a forma mais eficaz de ajudar todos os alunos - não só os melhores - a efetivamente aprender "e assim mudar o mundo".
Seguindo a linha de raciocínio de Naranjo, se queremos mudar o mundo, temos de investir em educação. Não se muda a economia, porque ela representa o poder que quer manter tudo como está. Também não mudaremos o mundo da caserna. Também não mudaremos o mundo por meio da diplomacia, como querem as Nações Unidas - sem êxito. Para ter um mundo melhor, temos de mudar a consciência humana. Daí o interesse do pesquisador pela educação. É mais fácil mudar a consciência dos mais jovens.
O atual modelo educacional parece obsoleto na opinião de Naranjo. Há um sistema que instrui e usa de forma fraudulenta a palavra educação para designar o que é apenas a transmissão de informações. Trata-se em sua opinião de um programa que rouba a infância e a juventude das pessoas, ocupando-as com um conteúdo pesado, transmitido de maneira catedrática e inadequada. O aluno passa horas ouvindo, inerte, como funciona o intestino de um animal, como é a flora num local distante e os nomes dos afluentes de um grande rio. É uma aberração ocupar todo o tempo da criança com informações tão distantes dela, enquanto há tanto conteúdo dentro dela que pode ser usado para que ela se desenvolva. É um sistema que quer um rebanho para robotizar. A criança é preparada, por anos, para funcionar num sistema alienante e não para desenvolver suas potencialidades intelectuais, amorosas, naturais e espontâneas.
A educação atual desperdiça talentos, rotulando-os com transtornos e distúrbios. Cientista chileno, Humberto Maturama, exemplificou a Naranjo que a membrana celular não deixa entrar aquilo que ela não precisa. A célula tem um modelo em seus genes e sabe o que necessita para construir-se. Um eletrólito que não lhe servirá não será absorvido. Podemos usar essa metáfora para a educação. As perturbações da educação são uma resposta sã a uma educação insana. As crianças são tachadas como doentes com distúrbios de atenção e de aprendizado, mas em muitos casos trata-se de uma negação sã da mente da criança de não querer aprender o irrelevante.
O papel do educador é leva-lo a descobrir, refletir, debater e constatar. Para isso, é essencial estimular o autoconhecimento, respeitando as características de cada um. Naranjo esteve no Brasil para participar do evento sobre educação básica Encontro de Educadores.  A educação é a única forma de mudar o mundo.

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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com

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