Favorita para se
tornar a primeira presidente mulher dos Estados Unidos, a ex-senadora ainda
terá de mostrar o que pensa – como se fosse uma novata. Madame Clinton deixou o
jatinho de lado, e com uns poucos assistentes, mais o aparato de segurança do
serviço secreto, prerrogativa de ex-primeiras-damas, iniciou uma viagem de van
mergulhando fundo pela América. Hillary persegue a Presidência com a obstinação
de um míssil teleguiado. Consciente da previsibilidade de seu movimento,
Hillary quebrou o protocolo e anunciou sua candidatura em um vídeo publicado
nas redes sociais.
Que ela quer voltar à Casa Branca no lugar que seu
marido, Bill Clinton, ocupou entre 1993 e 2001, é sabido. Mas, todos lembram,
que a última vez em que Hillary foi favorita como agora para se tornar a
primeira mulher presidente dos EUA, ela deu uma derrapada muito feia. Em
janeiro de 2008, estavam no início as eleições primárias democratas, a fim de
definir o candidato do partido. Hillary estava 20 pontos à frente de seus
rivais. Em junho, quando as primárias terminaram, ela perdeu a vaga para um
senador de Illinois, pouco conhecido e menos financiado – Barack Obama.
Ao sabor do tom populista que deve ser uma das principais
marcas da disputa eleitoral, nos dois lados do espectro político, cidadãos
representativos dos grupos integrantes da coalizão responsável pelas duas
vitórias de Obama (negros, asiáticos, hispânicos, jovens e gays) falam de seus
projetos para os próximos anos, na linha casamento, casa própria, filhos e
emprego. Somente nos segundos finais a ex-primeira-dama, senadora e secretária
de Estado surge para recitar sua própria meta de vida: governar a maior
potência militar do planeta.
A senhora Clinton quer dar a conotação de que será “mãe
dos americanos”, sua candidatura presidencial quer dar ênfase na busca pelo
“povão”. Em sua agenda não aparecem comícios, mas encontros com grupos
estratégicos, entre eles estudantes e pequenos empresários. Nas conversas,
acompanhadas por uma legião de repórteres, a mesma candidata que espera
amealhar cerca de 1,8 bilhão de dólares para a campanha bate duro no modelo de
financiamento eleitoral americano, sem teto para doações privadas e anônimas,
defendido pelos republicanos. Também oferece a mensagem central de sua
candidatura: foco no bolso da classe média, com novos programas de incentivo à
geração de empregos e de combate à crescente desigualdade social.
Ex-conselheiro espiritual de Clinton, o sociólogo e
pastor Tony Campolo tem apoiado Hillary abertamente. Segundo ele, que hoje em
dia costuma se encontrar com Clinton ao menos duas vezes por ano, Hillary
passou a considerar concorrer à presidência quando George W. Bush estava no
poder. “Ela se incomodava com o fato de que, enquanto o custo de vida subia
dramaticamente, os trabalhadores continuavam ganhando o mesmo que 20 anos
atrás”, afirma. Agora, a senhora Clinton garante estar empenhada em aumentar o
salário mínimo, limitar os juros cobrados pelos bancos e oferecer assistência
médica universal.
Críticos da aproximação com Cuba e da articulação de um
acordo com o Irã na área nuclear, os republicanos culpam a atual administração
pelo fortalecimento do Estado Islâmico e pelo desastre do ataque ao consulado
americano em Bengasi em 2012. Na ocasião, foram mortos quatro diplomatas,
incluindo o embaixador do país na Líbia. O episódio ocorreu durante a campanha
de reeleição de Obama e Hillary é acusada de ter dificultado a divulgação dos
ataques e suas motivações. O Congresso, de maioria republicana, instaurou
investigação e pode atormentá-la na campanha.
A pré-candidata pode enfrentar mais uma dificuldade para
seduzir o eleitor. Apesar de superexposta, poucos sabem o que Hillary pensa
sobre os assuntos mais candentes da política americana. A imagem de esfinge não
deve atrapalhar sua coroação no Partido Democrata, pois os adversários não têm apelo
nacional.
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SERGIO BARRA é médico e professor
Tomara que perca, mas a onda liberalóide na América é inexorável.
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