segunda-feira, 23 de março de 2015

Delicadeza no ocaso


            Os deslizes cometidos pelos envolvidos no escândalo da Petrobras preocupam os brasileiros, principalmente, o conflito entre o Palácio do Planalto e o Congresso Nacional que se intensificou após a acusação de políticos na operação Lava Jato. O País necessita de governabilidade agora que enfrenta uma crise econômica e social sem precedentes. Quando cometemos infrações em nosso trabalho, somos punidos e normalmente demitidos. Por que o mesmo não acontece com deputados e senadores – pelo menos até serem inocentados pelas investigações no Petrolão? Mais de 40 políticos que sangraram nossa maior estatal ainda estão em seus cargos. Portanto, deveriam ser afastados por ter deixado essa herança maldita, como nunca antes se viu na história deste País.
            O governo está confuso. A presidente está refém do próprio cargo por conta de erros e equívocos que comete a toda hora, sem trégua. A mobilização contra ela – para além dos escândalos, um desempenho impermeável, sem a menor capilaridade tanto na economia quanto na política – encontra motivos claros na própria personalidade de Dilma. É gritante sua inabilidade gerencial, soberba e falta de sensibilidade para o diálogo com os vários segmentos da sociedade vêm minando todo e qualquer capital de apoio que ainda lhe resta para continuar governando. Os rugidos, panelaços e insatisfações das ruas, são opiniões assertivas e logicamente impecáveis do povo, incomodam o governo e alguns de seus segmentos e suas notáveis vaidades.
            Não há quem duvide, os Poderes da República vivem um momento delicado e especial de equilíbrio. A opinião pública ganha força e se organiza para protestar contra a presidente e o PT. Os casos de corrupção, como o desvendado pela operação Lava Jato passam a sensação de que prevalece uma degradação institucional no Brasil. O País quer se livrar desse mar de lama. É preciso chamar a atenção para a existência de uma certa moral dupla. Refiro-me tanto à ética pública quanto à privada. A mudança ética no Brasil tem de ser pública e privada. Nossa Terra Brasilis está por demais fragilizada, a expressão “passar a limpo” já foi muito usada e nosso País continua, aparentemente, sujo.
O Brasil amarga a estagnação que o coloca nas últimas posições do crescimento global. Só não vê quem não quer. Estamos à mercê de um exército de malandros de gravatas que,por tamanha esperteza, tomou conta de tudo. A coleção de evidências no governo e sua insuperável inabilidade política em todos os campos e com inúmeros interlocutores alimentou a descrença geral em sua mandatária e colocou um grande ponto de interrogação sobre como conduzirá o País daqui para frente. O Brasil amadureceu e já não era sem tempo. Decorre de uma cidadania que se tornou mais consciente, mais exigente e, de certa forma, mais participativa. O problema é que as instituições ainda não conseguiram se ajustar a demanda.
Na verdade, na versão dos fatos, o descontrole dos gastos públicos, a disparada da espiral inflacionária, o tarifaço de energia e combustíveis que nos impuseram goela abaixo foram calculadamente omitidos pintados na cor pastel, a “inocência”, nas palavras do governo. Seu batalhão de assessores próximos não cansa de interpretar que se trata de manobra “das elites”. A retórica petista de um “movimento restrito” e “orquestrado” pela oposição está completamente fora de contexto. Claro, eles não sabem sair em desvantagem.
O governo está perdido, a presidente não consegue sair do Planalto ou simplesmente discursar em cadeia nacional sem riscos de ser fustigada. Falta-lhe tato, fala uma coisa e em seguida esquece. “Para sempre Alice” foi um dos poucos consensos do último Oscar – o de Melhor Atriz para Julianne Moore. Mostra a lida de uma professora de linguística com o diagnóstico de Mal de Alzheimer. Ela convence e comove no papel de Alice Howard, que lentamente começa esquecer as palavras e compromissos e se perde pelas ruas da Corte.

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SERGIO BARRA é médico e professor

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