segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

O apelo sedutor das sereias e o petrolão



Vários autores puseram em cena essa personagem atraente e perigosa da mitologia antiga. Como mulher-ave em sua origem, ela recebeu, com o passar dos séculos, uma cauda de peixe. Homero, na “Odisseia”, foi o primeiro a mencionar as sereias. Em um dos episódios mais conhecidos de sua obra, Jasão e seus companheiros, embarcados no navio “Argo”, voltando da Cólquida (mar Negro), deviam confrontar as terríveis sereias, que segundo autores antigos viviam em Nápoles, na costa do mar Tirreno - aliás, uma das lendas atribui a Partênope, um desses monstros, a fundação da cidade de Nápoles.
Contava-se histórias horríveis, de que marinheiros que passavam diante desse local, fascinados e seduzidos pelo canto das sereias, mergulhavam e chegavam à costa, onde eram devorados ou enfraqueciam aos poucos, até a morte, de tanto escutar as sedutoras. Mas Orfeu, com sua lira e seu canto, conseguiu salvar os companheiros da morte certa. Apenas Butes lançou-se ao mar, mas foi salvo por Afrodite. Os tripulantes do navio, os argonautas, conseguiram livrar-se do terrível perigo.
Era difícil escapar desses monstros marinhos na Antiguidade. A sereia é representada como uma mulher diabolicamente bela, que leva à morte aqueles que têm o azar de encontrá-la. Mas não tanto como o sábio e astucioso Ulisses. Ao deixar Circe, prevenido, o herói sabia que era esperado pelas sereias e, então, decidiu: “É preciso que, preso por laços fortes, eu permaneça imóvel, de pé no convés, apertado contra o mastro, e se eu vos ordenar que desatem os nós, apertai-me ainda com mais cordas e vamos passar rapidamente”. As sereias começaram a entoar os cânticos, pediam para Ulisses deter o navio e escutar suas vozes, pois “jamais um negro navio dobrou nosso cabo sem ouvir nossas doces árias”; e todos os males lentamente foram se dissipando e seus bravos companheiros então se apressaram em retirar a cera que Ulisses havia colocado em suas orelhas. E assim, chegaram à liberdade.
Lendas posteriores acrescentam que, ressentidas por ter deixado escapar uma presa tão ilustre, as sereias, em desespero, teriam se lançado ao mar e ao longo dos séculos se dispersaram pelos continentes no afã de tentar seduzir e destruir a humanidade com a prática da corrupção. Uma grande parte dessas sereias atravessaram os mares, muitas ao chegarem à costa brasileira, seguiram pelos rios, parte delas chegou ao Lago Paranoá e, através dos canais de detritos, foram parar em escritórios de empreiteiras, na Câmara dos Deputados, no Senado, na Esplanada dos Ministérios e em muitos outros “aparelhos”.
Faltou-nos um Ulisses, que se amarrou no convés e teve a lucidez de colocar cera nas orelhas de seus amigos marinheiros para não se corromperem. As sereias, chefiadas por Corruptina, encontraram terreno fértil e partiram para o assédio levando o apelo sedutor da corrupção para Paulo Roberto Costa, ex-diretor de abastecimento da Petrobras; Alberto Youseff, doleiro e operador do PP; João Vaccari Neto, tesoureiro do PT; Fernando Soares, operador do PMDB; todos estes operadores no esquema petrolão. Há, também, o envolvimento de vários diretores da estatal e uma roda da fortuna que envolve dezenas de implicados no cartel formado pelas maiores construtoras do país, que loteou licitações e causou prejuízos bilionários à Petrobras. O governo tenta dar tratamento político a um caso que é de polícia. Parece que temos é um problema de construção de Estado.
Para o azar de Corruptina e para o bem do nosso País, o canto irresistível e sedutor da corrupção encontrou o juiz Sergio Fernando Moro, suas decisões são técnicas e seus processos correm com segurança na qual os interesses políticos e econômicos passam despercebidos. Moro é considerado o maior especialista em lavagem de dinheiro da Justiça brasileira; está desvendando a face do crime e tem o poder de redimir o Brasil de tantas investigações frustradas e punições nunca aplicadas.

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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com

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