segunda-feira, 14 de abril de 2014

O olhar da direita


As urnas falaram mais alto e as dúvidas se dissiparam. Nem os mais céticos ousaram duvidar. As eleições municipais na França fortaleceram a Frente Nacional (FN) e François Hollande foi derrotado fragorosamente. Conservadores obtém votação recorde na França, expõem as deficiências do governo socialista e comprovam a força e a guinada à direita, com o nacionalismo grassando forte numa Europa corroída pela baixa estima e com o desemprego em alta. No domingo, 30 de março, o partido socialista foi severamente punido com uma abstenção de 48%. Perdeu nada menos que 175 municípios. E mais, a esquerda teve perdas importantes em Toulouse, quarta maior cidade do País e Limoges comandada pelos socialistas desde 1912. Essas duas cidades passaram ao comando da União por um Movimento Popular (UMP). A França foi inundada por uma onda azul, cor da formação conservadora.
Os franceses fizeram questão de solenizar nas urnas seu recado para o governo. Um fator preocupante, que incomoda a população é a carga tributária, uma das maiores de que se tem notícia, acoplada a uma maquina burocrática que de tão inchada, cresce desde os tempos da monarquia e, contínuos espetáculos de corrupção e abusos de poder - a França é corrupta, só que eles sabem empurrar a sujeira para debaixo do tapete melhor que os outros -, por isso, decidiu dar um basta castigando sem dó a turma da esquerda, dando credibilidade à direita, sufragando os seus votos na UMP, do confuso e atordoado ex-presidente Nicolas Sarkozy e na FN comandada pela filha do xenófobo, antissemita e racista, Jean-Marie Le Pen, a reacionária Marine Le Pen que se tornou uma das novas lideranças políticas da França.
O descontentamento dos franceses é com o governo de Hollande e com os políticos em geral. Segundo especialistas, Le Pen está mais suave, ou digamos assim, mais “domesticada” e deve endurecer a política com os imigrantes, mas sem instaurar uma república que quer expulsar os estrangeiros. Alinhou-se com líderes de partidos de direita das principais nações da União Europeia, para construir uma bancada de deputados que, primeiro, tente abolir o euro e, depois, se não for sonhar demais, varrer a UE para o lixo não reciclável da história.
Paris manteve-se como resistência da esquerda, com a eleição da feminista Anne Hidalgo, do mesmo partido do presidente, a primeira mulher a comandar a “Cidade Luz”. A cidade é a que tem o ar mais poluído da Europa Ocidental, devido ao exagerado consumo de diesel acima das normas de tolerância. Paris não é mais uma festa. Tem suas ruas imundas para os padrões europeus. Isso para não falar em quase uma centena e meia de acampamentos ciganos nas periferias, multidão de mendigos e uma criminalidade crescente.
O novo premier Manuel Valls (na foto), também conhecido como Sarkozy socialista, é chamado a formar um “governo de combate”. Valls nasceu na Catalunha e só obteve a nacionalidade francesa aos 20 anos. É um liberal que reconhece que defenderá matizes centristas, mas estranhamente se declara um “homem de esquerda”. Nem todos aprovaram a escolha de Valls. A começar pela ala esquerdista do Partido Socialista. Os líderes sindicais estão inquietos. Por essas e outras, Hollande o escolheu. Valls poderá angariar votos da direita e mesmo da extrema-direita. Mas é o presidente Hollande quem manda, estabelece a estratégia a ser seguida. No entanto, o premier é ambicioso e certamente se candidatará para representar o Partido Socialista (PS) na presidencial de 2017.
Na verdade, essa significante fatia da população que rejeita o sistema político capitaneado por Hollande, o confirma como o presidente mais impopular. A vergonhosa derrota do PS diante da conservadora UMP, criou abissais fissuras desta agremiação, dividida entre dois líderes e é grande surpresa que tenha tomado a dianteira. Longe da maioria dos habitantes das metrópoles, reina o extremismo. A França deve iniciar logo seu processo de reconstrução.

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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com

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