quarta-feira, 5 de março de 2014

Um atalho para a impunidade



Esta na hora de mostrar que não somos capengas. Cabe às autoridades competentes agir rápido para evitar uma crise de confiança no Brasil. O caminho do processo contra os réus do mensalão mineiro, esquema de desvios de recursos públicos para a campanha à reeleição em 1998 do governador de Minas Gerais, Eduardo Azeredo (PSDB), é cheio de curvas sinuosas. O esquema é considerado pelo Ministério Público o laboratório que permitiu, anos mais tarde, ao operador Marcos Valério gestar o mensalão federal. Por causa desse último, ex-próceres do PT dormem agora na cadeia. O mesmo ainda não ocorre com os protagonistas do mensalão mineiro, apesar de sua precedência cronológica.
Já o processo contra o ex-ministro Walfrido Mares Guia, titular das pastas de Turismo e Relações Institucionais durante o governo Lula, antes vice- governador de Minas e coordenador da campanha de Azeredo, foi declarado extinto pela justiça de Minas Gerais. A juíza da 9ª Vara Criminal de Belo Horizonte, Neide Martins, entendeu que as acusações de peculato (desvio de dinheiro público) e formação de quadrilha prescreveram em 2012, quando Mares Guia completou 70 anos. Outro que pode ser beneficiário da morosidade da Justiça deverá ser Cláudio Mourão, ex-tesoureiro da campanha de Azeredo. Mourão faz 70 anos em abril - e faltam dez testemunhas de defesa a ouvir.
O PSDB tenta isolar o ex-governador mineiro, cujo destino está prestes a ser decidido pelo Supremo Tribunal Federal (STF). As investigações dessas irregularidades foram comprovadas pelo Ministério Público Federal e Policia Federal, com desvios dos cofres mineiros de R$ 3 milhões à época, o equivalente a R$ 9,3 milhões em valores atuais, para a campanha à reeleição. Quem operou a fraude foi o publicitário Marcos Valério de Souza, condenado a 37 anos de cadeia no “mensalão” petista.
Nascia ali o embrião do esquema de financiamento ilegal de campanha mais tarde utilizado pelo PT. Em julho daquele ano, a agência de publicidade SMP&B, da qual Marcos Valério era sócio, pegou R$ 2,2 milhões no Banco Rural, também envolvido no escândalo petista. O empréstimo, serviu para abastecer os tucanos. A operação foi sugerida a Valério pelo tesoureiro de Azeredo, Cláudio Mourão, a pedido de Clésio Andrade, por causa da penúria financeira da campanha, conforme relato do publicitário à CPI dos Correios em 2005. Andrade tinha sido sócio de Valério na SMP&B e era vice na chapa de Azeredo.
O iminente julgamento de Azeredo não chegou a pegar o PSDB de surpresa, mas o rigor do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, sim. Janot pede 22 anos de prisão. Nos últimos dias, vários integrantes da legenda puseram em prática a estratégia de isolar o réu e minimizar o alcance dos crimes em Minas Gerais. O PSDB e Aécio em particular, tentam circunscrever o crime ao entorno de Azeredo. Em vão. Agora, pergunta-se: A estratégia conseguirá preservar o tucanato, durante a eleição, do contágio em caso de eventual punição de Azeredo?
Azeredo renunciou ao mandato de deputado federal, na quarta-feira, 19. O ex-governador de Minas Gerais produziu uma manobra que pode embaralhar o jogo da ação penal que investiga o mensalão mineiro. A renúncia do principal réu é uma manobra que expõe as divergências do STF e ainda pode ser inócua, se os ministros resolverem levar o processo até o fim.
Se o STF entender que a renúncia ao mandato do deputado foi uma manobra protelatória, Azeredo será julgado pelo STF ainda este ano. Não terá direito a recorrer a outras instâncias, a exemplo do que ocorreu com os réus do mensalão do PT. Contudo, se o STF decidir que a ação na qual Azeredo é réu deve ir para a Justiça de Minas Gerais porque ele não possui mais foro privilegiado, ele ganha tempo até a condenação. Pois um processo em primeira instância demora no mínimo uns seis anos para ser concluído e o condenado ainda tem o direito de recorrer ao STF. É a famosa saída pelos fundos.

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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com

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