segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Proletário do giz e do quadro verde


É preciso chegar ao âmago da questão. Estamos cansados de saber que em toda a nossa História o povo sempre esteve ausente da vida política. E um Estado de Direito só existe quando o cidadão controla a atuação dos governantes. Nosso Congresso vive de aparências, não cumpre o preceito constitucional da democracia participativa. É bom lembrar, pensar não custa nada. É importante que se dê tempo, aqui; o tempo é a história que ilumina as ciências sociais, da economia à política, da antropologia à sociologia. É bem verdade que as ciências sociais se tornaram a necrologia do nosso tempo. Mas a educação existe para nos dar renovado ânimo em face de um cotidiano que timbra em nos desanimar.
Desde o início, em toda a nossa História, o povo sempre foi ausente da vida política. Ao desembarcar na Bahia, em 1549, Tomé de Souza trouxe um minucioso Regimento de Governo, onde tudo estava previsto. Faltava apenas um elemento: não havia povo. Nossa primeira organização estatal assentou-se no vácuo. Nossa Independência, que, paradoxalmente, não foi o resultado de uma revolta do povo brasileiro contra o rei de Portugal, mas de uma rebelião do povo português contra o rei no Brasil, não suscitou o menor entusiasmo popular. A mesma cena, com personagens diferentes, repetiu-se em 15 de novembro de 1889, com a manifestação do marechal Deodoro e sua tropa no Campo de Santana. O povo assistiu atônito, bestializado, surpreso, sem conhecer o que significava.

Precisamos de menos kits e de melhores professores. A valorização dos
docentes é a única forma de construir uma escola eficiente.

Pois é, pensar não custa nada. Precisamos de menos kits e de melhores professores. A valorização dos docentes é a única forma de construir uma escola eficiente. Educar é o mesmo que informar. Informar é transmitir conhecimentos. Informar é expor conteúdos. Informar é, como se diz no jargão escolar, “dar a matéria” de uma disciplina científica ou humanística. Matéria que já acumulou séculos de dados, e que cabe ao professor passar ao aluno. Os meios, outrora restritos, multiplicaram-se hoje graças à internet.
A valorização do professor do ensino primário e secundário é a chave mestra que abre todas as portas de uma escola eficiente. Professor que ganha mal não tem tempo de estudar, nem de preparar seus cursos, nem de atender aos alunos: é apenas uma máquina de dar aula. Habituei-me a chamá-lo de proletário do giz e do quadro verde. Nada nem ninguém substitui o professor bem remunerado e tratado com dignidade.
No que diz respeito ao acesso aos instrumentos do saber, o Estado brasileiro é pródigo, para não dizer perdulário, em subsidiar editoras de livros didáticos e mercadores de kits ditos pedagógicos. Corre à boca pequena a informação de que nossos governos são os maiores compradores de livros.do mundo. E, mesmo assim, não tem elevado o nível de nossa escola pública, precisamente porque prefeituras e estados contam os caraminguás na hora de pagar um salário condigno ao professor. Uma medida salutar seria condicionar o recebimento de verbas federais ao compromisso, que as prefeituras assumiriam, de melhorar o salário dos docentes e estender o tempo de atividades escolares até perfazer um horário integral.
Educar para formar o cidadão é propiciar a emergência de um espírito crítico que leve o pensamento à ação cívica. Nesse particular, a escola é um viveiro de possibilidades, e os órgãos públicos responsáveis pelas opções curriculares devem dar espaço a programas que estimulem a reflexão sobre o cotidiano vivido pelo aluno na cidade ou no espaço rural. Há que ter coerência. Não é hora de chutar a esperança, de empobrecer a escola cada vez mais a serviço de uma elite despudorada. Viajar na ciência da adivinhação é um tanto difícil. Teorias malucas nada resolvem. O futuro nunca é previsível.

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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com

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