segunda-feira, 15 de julho de 2013
Praça Tahrir, nova primavera no Nilo!
As dunas do Oriente Médio se voltam para uma nova Primavera Árabe. O golpe no Egito afeta o Islã político em todo o Oriente Médio. Golpe? Não foi golpe! As Forças Armadas se colocaram ao lado da vontade popular. E os militares não tomaram o poder dessa vez. O judiciário queria manter o Estado laico e, diante disso, o ex-presidente Mohamed Morsi, primeiro presidente eleito democraticamente na história do Egito, decretou a si próprio muitos poderes. O governo Morsi não tinha mais legitimidade, uma vez que ele estava islamizando a sociedade. Além disso, a grande maioria da população acha que ele fez um péssimo governo.
Quem estivesse no centro do Cairo a borbulhar com fervor político, com presença no santuário de observadores da vida pública do Egito: o Café Riche, um pequeno estabelecimento comercial a duas quadras da simbólica Praça Tahrir, lotada de manifestantes, acreditaria ter voltado a 25 de janeiro de 2011. Lá, o povo festejava quando o exército depôs o presidente Morsi, da Irmandade Muçulmana. Fogos de artifício, bandeiras, buzinas, abraços entre os manifestantes e afagos nos militares, por vezes perplexos, faziam parte das comemorações.
O dia escolhido para gigantescas manifestações foi simbólico: um ano depois da eleição de Morsi. Essa “segunda revolução”, ou golpe militar – golpe, porém, sempre é golpe –, se quisermos ser precisos, derrubou o primeiro presidente eleito pelo sufrágio universal (e o primeiro islamita) 12 meses atrás. Os motivos dos dias de ira contra o presidente e líder da Irmandade Muçulmana? A economia que vai de mal a pior, e a Constituição adotada sob o governo de Morsi tem como objetivo islamizar o Egito.
O arquiteto do golpe, o general Abdul Fattah el-Sisi, chefe das Forças Armadas e Ministro da Defesa, havia dado um ultimato para que Morsi se demitisse ou chegasse a um compromisso com os manifestantes dentro de 48 horas, prazo a expirar na quarta-feira, 3, às 16h30. El-Sisi encerrou um ano e três dias da inédita experiência democrática egípcia com a infalível receita clássica de um golpe militar: depôs o presidente, colocou-o em prisão domiciliar, suspendeu a recém-criada Constituição, dissolveu o Parlamento e prendeu líderes da Irmandade Muçulmana. Adli Mansour, presidente do Tribunal Constitucional, assumiu interinamente a Presidência.
Entre os participantes do movimento havia desde laicos, como o líder Mohamed el-Baradei, ex-diplomata das Nações Unidas e Nobel da Paz (2005) pelo seu trabalho na Agência Internacional de Energia Atômica (Aiea), até salafistas extremistas descontentes com o fato de Morsi não ter implantado a Sharia (código de leis do Islã) no país. De qualquer forma, a Irmandade Muçulmana, legenda mais bem preparada a vencer as eleições no Egito, será, digamos assim, mantida às margens do próximo pleito. El-Sisi tem mantido conversas com El-Baradei, o clérigo sunita xeque Ahmed Tayeb, e o papa copta Tawandros II. Nenhum representante da Irmandade Muçulmana tem participado dos encontros.
O golpe militar no Egito faz meus nervosos colarinhos ficarem com certa reserva diante daqueles que duvidam da capacidade de países da região de abraçar a democracia. Longe de por fim à revolução egípcia, a queda de Morsi mostrou que ela tem ainda um longo caminho a percorrer. A primavera Árabe, como um todo, ainda é uma revolução em curso. Todos os países estão em lento processo de transição.
O povo continua nas ruas, o risco de um conflito não pode ser descartado e o futuro é tão incerto quanto em 2011. Os clientes do Café Riche, ainda estão por lá, olhando pela janela assistindo os protestos dos manifestantes. São janelas que acompanharam um passado cheio de turbulências e vislumbram para o futuro um país tentando se reformular. O Egito continua sob tensão. Tomara que o Riche fique em silêncio e que todos saiam às ruas para comemorar a democracia.
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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com
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