terça-feira, 21 de maio de 2013

Quando os jornais acusam os suspeitos errados


Por JEFFREY HERMES, no Observatório da Imprensa
Houve uma cobertura excepcional das bombas da maratona de Boston e uma posterior caça às bruxas, tanto pela grande mídia quanto pela independente. Mas um aspecto, em especial, que se destacou entre muitos comentaristas foi o papel desempenhado pela mídia social. Para muita gente na área de Boston, plataformas como o Twitter e o Reddit tornaram-se fundamentais para que a comunidade pudesse expressar suas experiências e reações – raiva, medo ou orações. Na área de Watertown, as mídias sociais assumiram outro aspecto, como maneira de nos comunicarmos – sentados e trancados em nossas casas – em busca de notícias e apoio.
No entanto, também houve controvérsia em relação às mídias sociais – em especial, preocupações com a “caça às bruxas” entre usuários destas mídias quando os suspeitos ainda eram desconhecidos. Embora esses problemas não se limitassem às mídias sociais, houve comentários significativos sobre como elas ajudaram ou dificultaram os esforços de aplicação da lei e a compreensão do público numa situação de crise.
À medida que tentamos avaliar em perspectiva os acontecimentos do mês passado, pode ser útil lembrar que está longe de ser a primeira vez que reportagens sobre ações de terror criam equívocos e identificações erradas. Pelo contrário: o impulso natural em buscar identificar os autores de atos horrendos o mais rapidamente possível, muitas vezes leva à divulgação de esforços legais que atingem pessoas posteriormente julgadas inocentes de qualquer irregularidade. O exame dessas situações – e de suas consequências judiciais – pode revelar se estes são temas únicos que podem ser atribuídos às mídias sociais ou se são questões que geralmente surgem em reportagens após ataques terroristas.
A bomba de Lockerbie
No dia 21 de dezembro de 1988, um explosivo detonou o voo 103 da Pan American sobre a cidade de Lockerbie, na Escócia, resultando na morte de todos os passageiros e tripulação, assim como outras pessoas, no solo, mortas pelos destroços. No dia 31 de janeiro de 2001, um oficial do serviço secreto da Líbia foi condenado e preso, acusado de ter colocado a bomba no avião. Nos 12 anos de intervalo, houve uma ampla discussão e especulação sobre quem seria o responsável pela bomba, com o governo da Líbia no centro da principal teoria – mas com muitas outras teorias alternativas.
Uma delas foi publicada como matéria de capa da revista Time, em abril de 1992, e sugeria que a bomba era coisa de um grupo palestino procurando eliminar agentes de contraterrorismo norte-americanos que estariam no voo. Segundo o artigo, o grupo palestino teria identificado o voo que levava os agentes norte-americanos com a ajuda de um agente duplo (dos EUA/Irã) chamado David Lovejoy. A revista também publicava uma fotografia do suposto Lovejoy, que teria sido obtida de uma declaração sob juramento numa ação civil relacionada ao atentado. A declaração dizia que uma fonte anônima identificara Lovejoy como o homem da imagem.
Na realidade, a fotografia era de outro homem, Michael Schafer. O Tribunal de Recursos da 11ª Vara dos Estados Unidos descreveria o erro posteriormente dizendo que “o artigo da Time, portanto, identificou equivocadamente Schafer, que então trabalhava como zelador em Austell, estado da Geórgia, como traidor do governo dos Estados Unidos e participante do atentado à bomba do voo 103 da Pan American”. Schafer pediu uma retratação da Time, que a revista publicou mais de um mês depois. Ele também processou a empresa Time Inc. por difamação. O júri votou a favor da Time em menos de uma hora. Schafer entrou com recurso e o tribunal concedeu um novo julgamento por considerar que as instruções passadas ao júri eram vagas no que se referia a se Schafer apenas tinha de provar que a revista fora negligente ao apurar os fatos (o padrão adequado de responsabilidade) ou se houvera algum intuito por parte da Time de prejudicar alguém. O tribunal deliberou que seria concedido à revista Time o direito de argumentar, num novo julgamento, que não fora negligente ao confiar na declaração juramentada do advogado.
Time chegou a um acordo com Schafer antes do novo julgamento.

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