segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Evidentes diferenças de circunstâncias


Era uma vez a “outra” América. Expansão territorial e desenvolvimento da ordem burguesa nos Estados Unidos. Para se tornar o país mais poderoso e mais rico do planeta e difundir o estilo de vida de seus habitantes por todos os continentes, foi preciso que os EUA fizessem em ritmo acelerado, a passagem de uma sociedade colonial para um Estado soberano, pré-industrial e predominantemente rural até aproximadamente meados do século 19. E também que enfrentassem, na década de 1860, os horrores de uma guerra civil, responsável pela consolidação definitiva da ordem burguesa e pela intensificação vertiginosa do seu desenvolvimento econômico.
Em meados do século XIX, alguns atores políticos mudaram suas posições. Percebendo que os pequenos proprietários do oeste seriam adversários da escravidão e teriam dificuldades para o fácil acesso às terras, designando as pradarias entre o Texas e o Canadá. A burguesia nortista percebeu que o crescimento do oeste aumentara a oferta de alimentos e de produtos manufaturados. Depois, os representantes do sul abandonaram as instituições governamentais dos EUA para formar sua própria Confederação.
A ruptura veio com as eleições de 1860. A vitória de Abraham Lincoln, um candidato nortista, abolicionista e republicano, portanto contrário aos interesses sulistas, levou os Estados sulistas a deixar a União para formar em seguida um novo país, os Estados Confederados da América.
Guardando as devidas proporções à época dos acontecimentos, digamos, falta um Lincoln ao Brasil? Ou, reformulando, de um líder político que tenha a ambição de deixar um legado maior que o próprio poder. O presidente americano enxergava mais longe, e com mais nitidez, que seus conterrâneos, e mais, havia algo a dizer ao país do mensalão. Lincoln, político íntegro, recorreu a expedientes escusos. Teve seu pequeno mensalão. Foi a maneira que encontrou para aprovar emenda no Congresso para acabar com a escravidão. As vantagens que Lincoln oferecia limitavam-se a cargos no segundo escalão do seu segundo governo que se iniciava - Lincoln não autorizou o suborno com dinheiro, embora alguns insistissem. Deu certo - e o presidente conseguiu aprovar a legislação mais importante da história dos Estados Unidos. Marcos Valério, ao contrário dos que queriam os dólares, não tinha limites: recebeu ordens de José Dirceu para subornar os parlamentares com milhões. Obviamente, não deu certo. Deu cadeia.
Duas visões sobre a responsabilidade. William H. Seward era o secretário de Estado de Lincoln e seu principal interlocutor político. Parecido com o presidente, estavam na política para abolir a escravidão. Reagiu com indignação à ideia de Lincoln de oferecer cargos. Mas capitulou. Aceitou a responsabilidade pelo que estava fazendo. José Genoíno, presidente do PT durante o mensalão, pensa sobretudo no partido e preza o princípio da lealdade aos companheiros. Diz que nunca soube de dinheiro para o valerioduto, que assinou os empréstimos de Marcos Valério sem ler e sustenta até hoje que tudo era responsabilidade de Delúbio Soares.
A Europa agoniza, não encontrou seu Lincoln. No Brasil, como no resto da América Latina, abundam líderes que lideram para si mesmos. Ou que lideram seu povo em direção à ruína. Lincoln ilumina o melhor – e o pior – que a política pode ser. Apesar das evidentes diferenças de circunstâncias. Líder não tem sua reputação esgarçada.

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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com

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