segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Da aldeia global à alcova global

Jodie Foster: saudades dos tempos em que a privacidade "era uma coisa bonita"
Nunca antes, jamais, em tempo algum, na história deste país, ou melhor, na história desta humanidade, tantos se expuseram tanto e tão intensamente como nestes tempos em que aldeia global, imaginada por McLuhan, virou, em verdade, uma alcova global.
Ao ser premiada no Globo de Ouro, a atriz Jodie Foster usou o palco para fazer um discurso sobre o direito de cada um à privacidade. Sobretudo no caso de celebridades como ela.
"Naqueles dias muito pitorescos, quando uma garota frágil escolhia se abrir com amigos confiáveis, e com a família, assim como com colegas de trabalho e depois, gradualmente, orgulhosamente, com todo mundo que a conhecia. Mas agora aparentemente se espera que toda celebridade dê detalhes de sua vida privada em entrevistas coletivas", disse Jodie Foster. "Privacidade. Em algum dia no futuro as pessoas vão olhar para trás e se recordar de como isso era bonito."
Pois é.
O mais pitoresco disso tudo é constatar que não são apenas as celebridades que perderam a privacidade.
O cidadão comum também.
Aquele que nunca foi e nunca será uma celebridade banalizou o conceito de privacidade ao expor-se de forma assustadora na aldeia, ou melhor, na alcova global.
Na alcova global, abre-se mão da privacidade em favor da exibição - pura e completa - do melhor e do pior que a natureza humana enseja.
Na alcova global, abrigada nas redes sociais, sabe-se como foi que o cara - ou a cara - dormiu à noite, o que comeu no almoço, qual a panela que usou para fazer o seu assado - ou o seu cozido - e qual o conteúdo do último enfrentamento com o parceiro ou parceira, ao travarem uma DR, como se convencionou codificar a discussão sobre relação entre casais.
Em regra, celebridades, porque já são célebres e naturalmente se veem expostas à exaustão têm sua privacidade arrancadas, roubadas, devassadas por terceiros.
No caso dos anônimos - milhões, bilhões deles - que se expõem na alcova global, a privacidade é renunciada voluntariamente, é chutada para o lixo, é aviltada, banalizada e praticamente coisificada, sob o alegação de que o gregarismo virtual ajuda a construir um mundo melhor.
É?
Ajuda mesmo?
Leiam Jodie Foster: "Privacidade. Em algum dia no futuro as pessoas vão olhar para trás e se recordar de como isso era bonito."
Era mesmo.

Um comentário:

  1. Cláudia Xerfan15/1/13 10:17

    Em tempos de tamanha exposição como o nosso, uma reflexão que relembre a importância da privacidade, do conceito do que é privado, íntimo, portanto, a ser guardado e, quando compartilhado, com cuidado, é de fato preciosa. O que parece ser muitas vezes um excesso narcísico nas redes sociais, talvez nos aponte muito mais o desamparo, a baixa estima e a fragilidade dos vínculos na atualidade. Que Narciso é esse de tantos espelhos????

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