sexta-feira, 9 de novembro de 2012
A Vale e o jabuti
Por CHARLES ALCANTARA, presidente do Sindicato dos Servidores do Fisco Estadual do Pará (Sindifisco-PA), em seu blog, sob o título acima
Diz a sabedoria popular que se um jabuti for encontrado no alto de uma árvore, alguém deve tê-lo colocado lá, porque jabuti não sobe em árvore.
Há muito o Brasil assiste ao famigerado tratamento dispensado a Estados e Municípios mineradores, que recebem uma mísera compensação financeira em troca de pesados e irremediáveis impactos ambientais que são obrigados a suportar.
Estados e Municípios mineradores, se comparados com Estados e Municípios petrolíferos, recebem troco em troca de crateras, doenças, violência, degradação.
Enquanto no Brasil as mineradoras pagam de 0,2% a 3% do faturamento líquido pela exploração mineral, os royalties pagos pela exploração do petróleo chegam a 10% do faturamento bruto.
Austrália e Índia, potências minerais, cobram 7,5% e 10% do faturamento bruto das mineradoras, respectivamente.
Mas como explicar, então, essa abissal diferença entre o que é pago em royalties pela exploração do petróleo e o que é pago em Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM)?
E como explicar por que as várias proposições de aumento da CFEM são bloqueadas no Congresso Nacional?
Quem colocou esse jabuti no alto da árvore?
Por que o privilégio a quem paga CFEM em relação a quem paga royalties do petróleo?
À Petrobras, os rigores de uma exploração ambientalmente danosa, como deve ser em qualquer país sério.
À Vale, as honras da casa, como se tratasse de uma benfeitora nacional, coisa que está muito longe de ser.
Em setembro de 1996, a Lei Kandir, que desonerou de tributos (sendo o principal deles o ICMS cobrado pelos Estados e Distrito Federal) todos os produtos e serviços destinados à exportação, inclusive os produtos primários.
Caminho aberto para, oito meses depois, em maio de 1997, o governo federal privatizar a então Vale do Rio Doce.
Ao longo desses anos, mais sangria nos cofres públicos de Estados e Municípios e mais – muito mais e cada vez mais – lucros para a Vale.
Os baixíssimos preços cobrados à Vale pela exploração mineral em solo brasileiro são um deplorável exemplo de submissão de uma nação inteira aos interesses de uma empresa.
A Vale financia campanhas eleitorais majoritárias e proporcionais, de cabo a rabo, da direita à esquerda, de norte a sul, de leste a oeste, do planalto a planície.
A Vale paga muitos milhões em propaganda ufanista para apregoar o quão bem faz ao Brasil e aos brasileiros. São milhões em propaganda paga aos maiores veículos de comunicação do país; propaganda que se converte em blindagem, proteção, alinhamento.
A Vale reserva outros milhões para ações sociais, culturais e ambientais, na esteira da tal “responsabilidade social”, que lhe serve de escudo para ocultar as mazelas decorrentes de sua atividade exploratória.
A soma dos milhões aplicados em campanhas eleitorais (o financiamento eleitoral é aplicação de alta lucratividade para a Vale), mais os milhões investidos em propaganda e mais os milhões gastos em “responsabilidade social”, é ninharia se comparada com os bilhões em lucros que a Vale aufere com a exploração das riquezas do nosso solo e com os privilégios que recebe do poder público brasileiro.
No bom e claro português, a Vale “compra” apoio nos parlamentos, nos executivos e na mídia comercial.
O sistema vigente de financiamento de campanhas eleitorais serve aos interesses e aos negócios da Vale.
O governador de Minas Gerais, Antonio Anastasia, em artigo recente, ao exortar os mineiros à luta por compensação financeira mais justa a Estados e Municípios pelo minério que é extraído de seu solo, invocou o espírito dos inconfidentes.
No Pará, o Estado da federação mais lesado pelo baixo retorno financeiro da exploração mineral, o espírito cabano precisa juntar-se ao dos inconfidentes, a fim de que paraenses e mineiros façam descer esse jabuti da árvore, pois foi gente, e não enchente, que o colocou.
Charles Alcantara é
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