quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Magistrados deixaram de confiar nas eleições para juiz

Por João Ozorio de Melo do Consultor Jurídico

A magistratura americana está em uma situação complicada. Dessas que, se correr o bicho pega, se ficar o bicho come. Há dificuldades para decidir qual dos dois sistemas vigentes no país para escolha de juízes é pior: o de nomeação de juízes por autoridades do Executivo ou o de eleições de juízes pelo voto direto. Ambos estão minando a credibilidade dos tribunais perante a opinião pública.
A desconfiança da população — e da comunidade jurídica — no sistema de nomeação é mais antiga, porque ele politiza os tribunais. Agora, o grito de alerta vem dos próprios magistrados, que estão preocupados com alguns efeitos colaterais do sistema de eleição para escolha de juízes.
"O fantasma da corrupção está rondando os tribunais". "A opinião pública está se voltando contra a magistratura". "Os advogados evitam disputar cargos de juiz, com receio de prejudicar suas carreiras jurídicas". "Os juízes de primeira instância evitam concorrer para tribunais superiores, porque não querem seus nomes atados para sempre à dinheirama". Essas foram algumas das declarações do ministro da Suprema Corte de Montana James Nelson e do ex-ministro da Suprema Corte de Mississipi Oliver Diaz Jr, em um evento da magistratura americana em Washington, na segunda-feira (13/8).
Por trás dessas preocupações compreensíveis dos ministros está o crescimento "assustador", nos últimos tempos, dos investimentos de grandes corporações nas campanhas eleitorais dos juízes, de acordo com alguns sites jurídicos, como o Law.com e o The National Law Journal.
Em 1990, uma campanha ficava em torno de US$ 25 mil. Em 2000, se teve notícia de que uma campanha ganhadora custava cerca de US$ 1 milhão. De 2010 para cá, a bolsa cresceu para a casa dos milhões, avaliam os juízes. Isso porque uma decisão da Suprema Corte dos EUA, nesse ano, liberou os investimentos de corporações e sindicatos em campanhas eleitorais (para o Legislativo, para o Executivo e, talvez meio que sem querer, para o Judiciário). Para usar a terminologia oficial, a decisão "proibiu o governo [no caso, a Comissão Eleitoral Federal] de restringir despesas políticas independentes de corporações e sindicatos" em campanhas eleitorais, de acordo com a Wikipédia.
As grandes corporações, desde então, passaram a investir pesadamente em campanhas eleitorais de juízes do estado (ou do condado) onde operam seus negócios. E onde está a jurisdição estabelecida para resolverem suas pendengas judiciais. Os ministros afirmaram que esses são fatos comprovados por dois estudos de campanhas estaduais, realizados pelo Centro para o Progresso Americano (Center for American Progress), um grupo de pesquisa multidisciplinar, de preferências liberais.
"Muita gente dentro e fora dos tribunais acredita que todo esse dinheiro investido nas campanhas eleitorais dos juízes influencia as decisões judiciais. Esse é um estado de coisas muito triste", disse Oliver Diaz. Para James Nelson, o Judiciário está correndo um sério risco. "Nada que caia na economia do livre mercado pode ser sacrossanto", declarou. Na opinião dos dois, o que o Judiciário mais precisa, no momento, é de transparência.
As grandes corporações sabem, mais do que qualquer outra entidade, como fazer uma campanha bem feita e utilizar artifícios que influenciam a opinião pública, sem deixar claro sua posição nas eleições. Diaz citou o caso de uma eleição em que uma grande corporação patrocinou um anúncio televisivo que atacava o adversário de seu candidato preferido. O anúncio bradava que o juiz [adversário] era um anulador de condenações criminais. Os políticos americanos sabem que agrada ao eleitorado a promessa contrária: a de endurecer no combate ao crime. Essa é a principal razão porque os Estados Unidos estão entre os países que têm as penas mais altas do mundo, dia a revista The Economist.
No que se refere ao sistema de nomeação de juízes por autoridades políticas, a visão da opinião pública é tampouco alentadora para o Judiciário. A credibilidade da Suprema Corte dos Estados Unidos vem caindo progressivamente desde 2000, quando os votos dos nove ministros da Corte elegeram George Bush para a Presidência do país, em detrimento da vontade do eleitorado. Desde então, uma série de decisões por 5 a 4 fez a maioria dos americanos pensar que a Corte decide por tendências políticas dos ministros, embora as discussões se travem em torno de aspectos jurídicos, de acordo com pesquisas feitas, separadamente, pela CNN/ORC International e pela CBS News/New York Times. Nessa última, 76% dos entrevistados declararam acreditar que os ministros, em alguns casos, são influenciados por suas preferências pessoais. Apenas 13% pensam que os ministros decidem com base em análises jurídicas.

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