segunda-feira, 29 de agosto de 2011

O dilema da presidente



Apresidente Dilma Rousseff se vê diante do dilema: manter o estilo de gestora e a assepsia do governo ou agradar aos políticos para garantir sua base de apoio? Trata-se de uma situação conflitante em seu primeiro ano de mandato. Como toda coisa nova, não é fácil entender o governo da presidente. Difícil ainda é enxergar para onde está indo. O que há de novo? Este é de fato o primeiro governo genuinamente de continuidade na nossa história moderna. Em geral, sempre tivemos sucessões de rupturas.
Desconsiderando aqueles da República Velha, desiguais demais para comparar com os subsequentes e nos quais tampouco houve algum que se pudesse dizer que era de continuidade. É bom lembrar que assim foi de Eurico Gaspar Dutra para Getúlio Vargas, de Café Filho para Juscelino Kubitschek, dele para Jânio Quadros e daí para Jango Goulart. Até a eleição de Fernando Collor, que foram longos anos de anormalidade e improvisações, a maior parte delas discricionárias.
De fato Dilma é a primeira presidente eleita para dar continuidade ao governo que a antecedeu. O “Caçador de Marajás” não era isso para José Sarney, Fernando Henrique se sentia maior que Itamar Franco (e era), e Lula e FH haviam sido adversários (quase) a vida inteira. A continuidade propiciada por sua reeleição em 2006, assim como pela de FH em 1998, é diferente. O que na realidade ambos tiveram foram mandatos longos, renovados no meio do caminho.
Estamos vivendo algo que é comum na maior parte dos países democráticos, mas que é inusitado para nós. Embora nossos costumes não estranhem situações como os 20 anos de governos peessedebistas em São Paulo, não sabemos o que acontece quando o que está em questão é a Presidência da República, muito mais relevante em termos simbólicos e concretos. Será, digamos assim, que o chamado fatigamento de materiais, o desgaste causado pela passagem do tempo, se torna problema mais cedo que no nível estadual?
A presidente não foi percebida como “salvadora”, predestinada a fazer mudanças. Ninguém a viu como “intelectual brilhante”, capaz de detonar a inflação com golpes de genialidade. Não foi eleita em razão de sua biografia de maior liderança popular de nossa história. Mas tem o mérito de ser uma boa gestora, atributo quase irrelevante na escolha dos que a antecederam. Uma profissional da administração pública, sem experiência parlamentar e sem muitos anos de convivência com as raposas e outros animais que habitam a Corte.
A presidente mostra ter menos disposição de considerar natural o que os outros achavam inevitável. Talvez em razão de sua pequena familiaridade com o modo de ser dos políticos, está sendo diferente do que se esperava. Quando foi a última vez em que um presidente disse, sem papas na língua, que ia fazer “uma faxina” nas burocracias mais famosas por sua aparente blindagem? Quem arregaçou as mangas e trocou ministros e assessores com a mesma rapidez?
Pois é, Dilma não pode paralisar a faxina diante dos problemas políticos. A liturgia da corrupção é danosa, insensata, repugnante e, agregue-se a isso, o ritual de decomposição moral a que somos submetidos. Pena que a presidente não esteja recebendo o apoio que merece nesse processo. Seus aliados na Corte estão assustados, a parte moderna das oposições se cala para não legitimá-la, a grande mídia prefere se omitir. Presidente, os filhos da Viúva, cedendo ao movimento de seus corações, agradecem.

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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com

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