segunda-feira, 8 de agosto de 2011
Não se preocupe, o avalista é você
O presidente da Confederação Brasileira de Futebol, Ricardo Teixeira, com seu olhar de suplicante, lembra um pintor de personagens. No seu caso, atuar e pintar têm muito em comum. Sabe começar pela aparência externa e vai desbastando as camadas até chegar ao núcleo central. Seu inconfundível olhar perdido e os músculos da mímica contraídos mostram toda sua amargura diante do chamado: cala-te, boca. A recomendação é para valer.
Muitos podem até ter dó de Teixeira, achando que ele sofre de esofagite de refluxo, já que vomita tanta coisa no ventilador. E mais, a despeito da pose de senhorio, ele não tem nem mesmo algum tipo de certidão, se é que ela existe, pois, em caso positivo, teria de comprar uma das mais graduadas para compensar sua falta de “modos”, como diziam os mais velhos.
O futebol nos toca nas entranhas, não há outro país onde a bola influa de forma tão imperiosa nos humores cotidianos da nação, a funcionar como fator de união e de apelo à identidade. Capaz até de propiciar um raríssimo instante de igualdade, na terra tão desigual, na hora em que o herdeiro da casa-grande levanta hosana ao herdeiro da senzala e o eleva ao altar dos heróis da pátria de chuteiras.
E então, vejamos. Permito-me alimentar a certeza de que uma pesquisa de pequeníssimo calibre provaria que a torcida brasileira não está somente decepcionada com os desempenhos da seleção, e tem boas razões para tanto, mas também, e sobretudo, ofendida pelas trajetórias assumidas pelos negócios da bola. Façam a sua própria investigação, perguntem ao acaso: terão de verificar que a maioria identifica o time nacional com as mazelas da CBF, vislumbra a bandalheira no rumo da Copa e se inclina, espanto dos espantos, a torcer contra.
Sempre fui contra a ideia de sediarmos uma Copa. Temo pelo resultado. Não temos rodovias, ciclovias, portos ou aeroportos para receber o mundo que nos visitará. Tudo está por fazer e a maioria sem tempo hábil para concluir. A situação dos aeroportos brasileiros é mais que incisiva: não teremos quase nenhum pronto para a Copa, se é que algum chegará a tanto. Algo que não surpreende, uma vez que as dificuldades para adequar o País a eventos tão grandiosos já eram esperadas. Quem viaja pelo Brasil e necessita utilizar transporte aéreo sabe como anda a capacidade dos nossos aeroportos.
Agora, estamos na casa do “sem jeito”. Pergunta-se: Por que não usar os bilhões de reais para investimentos em saneamento básico, como por exemplo, redes de esgoto, deixando que outros países sediem o torneio? Como fomos “escolhidos”, restava-me, após estranha “desclassificação” do Morumbi, que São Paulo ficasse fora do evento. Mas, de repente, Ricardo Teixeira e os políticos paulistas tiram o Itaquerão, um estádio inexistente, da cartola. Questionado algumas vezes se o milagre do Itaquerão iria mesmo se consumar até a Copa, o presidente do Corinthians - e Merlin do projeto - apresentou sua garantia: Lula quer. Um argumento forte. Como todos sabem, quando Lula quer, os caminhos se abrem - e os cofres também.
A engenharia financeira do novo estádio é mais espetacular que final de Copa do Mundo. Já falam em mais de R$ 1 bilhão, quase tudo bancado com recursos públicos ou com funding do BNDES, num estádio menor, começando do zero? O mais genial dessa engenharia é que o garantidor final de recursos, o avalista do BNDES, é uma entidade que nunca falha: você.
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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com
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