quarta-feira, 27 de julho de 2011

A indignação fermenta


Os descaminhos da economia da União Europeia, de enigmático desfecho, encontra análises díspares. Especialistas sustentam que há uma luz no fim do túnel. Mas não sabem quanto tempo esta crise vai durar, alegam que a Europa já atravessou guerras, confrontos, tantas coisas... Sim, e vão sobreviver a mais essa. É, pode ser. Descontados os que sabem perfeitamente que sofismam, sobram os otimistas e os esquecidos a compartilhar dessa visão.
A crise econômica catapultou para elevadas alturas os níveis de dívidas, déficits públicos e taxas de desemprego. A Grécia, por exemplo, tem uma dívida pública de 119%. A Espanha, considerada um dos países mais frágeis da Zona do Euro, está com 60% de dívida publica. Tem, portanto, um endividamento inferior aos de Grécia, Irlanda e Portugal. Pior: a economia espanhola é tão grande quanto as economias gregas, irlandesas e portuguesa juntas. Pergunta-se: A UE e o FMI poderiam criar um pacote de resgate para um país dessa dimensão?
Nesse atual clima de insegurança, a situação piora com a chegada de imigrantes do Norte da África, onde insurreições no contexto da Primavera Árabe parecem intermináveis. E assim, governos conservadores como os de Nicolas Sarkozy e Silvio Berlusconi, ambos pressionados por legendas de extrema-direita, argumentam sobre a necessidade de reerguer fronteiras temporárias. Em jogo estão, por tabela, regras do acordo de Schengen, que permite a livre circulação de cidadãos (a trabalho ou em viagens turísticas) através de várias fronteiras da zona da UE.
Agora, a crise bate à porta da terceira economia da Europa, a Itália. A crise financeira que há tempo corrói o país do sultão Berlusconi alcançou o ponto máximo nos últimos dias, de uma forma súbita e inesperada para os poupadores, mais previsível do ponto de vista político. Deu-se o ataque especulativo nos mesmos dias em que o Parlamento devia votar o plano de austeridade econômica de 47 bilhões de euros apresentado pelo ministro da Economia, Giulio Tremonti.
Causa preocupação também o contínuo aumento do diferencial entre o custo da dívida italiana e aquele alemão. Semanas atrás a taxa de juros dos títulos italianos de dez anos era superior àquela dos bund alemães e neste julho cresceu até 3,5% para baixar levemente alguns dias depois para algo em torno de 0,5%. Além disso, o pacote de medidas anticrise dilatou-se notavelmente de 47 bilhões para 79 bilhões, com o objetivo de alcançar o equilíbrio no balanço do Estado até 2014. Esse plano de Tremonti, na terminologia adotada pela mídia, é chamado de a “manobra”. E na quinta, 14, o Senado aprovou a “manobra”.
O maior problema italiano é o da credibilidade e, nesse enredo, Tremonti arca com um papel decisivo, tanto do ponto de vista estritamente econômico, mas também político: o ministro, filiado à Lega Nord, tem de enfrentar Berlusconi e, ao mesmo tempo, é a ele que cabe salvá-lo. Ah, o sultão tentou incluir no pacote uma medida que o favorecia como dono da Fininvest. Tremonti e a Liga impediram.
Há quem afirme que a “manobra” é a derradeira batalha do sultão, e a sua Waterloo. Massimo D’Alema, líder histórico do Partido Democrático, ex-comunista, o principal de oposição, acredita que, uma vez aprovada a austeridade, Berlusconi não terá alternativa se não “sair imediatamente de cena”. O remédio contra a crise poderia ser o fortalecimento da UE, faltam, porém, líderes à altura e vontade política.

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SERGIO BARRA é médico e professor

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