quarta-feira, 1 de dezembro de 2010
Cotas regionais para concursos
O Brasil tem avançado bastante quanto à diminuição da desigualdade entre sua população. O sistema de cotas, que reserva uma percentagem em seleções públicas para grupos historicamente excluídos, tem funcionado bem e cooperado nesse processo. Um bom exemplo temos na questão do negro e de pessoas com certas limitações físicas. São, de fato, grupos sociais que merecem uma atenção especial do Estado.
Porém, há algo mais que precisa ser feito para atenuar o abismo que separa algumas regiões brasileiras no tocante ao acesso a cargos públicos. Estou falando da necessidade de uma política de cotas para pessoas naturais das regiões Norte e Nordeste.
Hoje, vivemos a era da unificação de provas e concursos. Com testes elaborados por institutos e faculdades do sul do país, todo brasileiro é tratado como se igual fosse em matéria de oportunidade de formação. Mas sabemos que isso não é verdadeiro. As regiões Norte e Nordeste foram e são, com exceções pontuais, historicamente alijadas do desenvolvimento educacional do resto da nação.
Esse distanciamento geopolítico pode ser mensurado quando comparamos a idade e o número de escolas superiores do sul do país. Enquanto o Pará, por exemplo, representa ainda um vazio geográfico de campus, assistindo ao nascimento de uma universidade entre décadas, o sul contabiliza vultoso número dessas casas de ensino e conta com universidades tradicionalíssimas. E não se trata apenas de mensuração de prédios escolares. Naturalmente, o surgimento de universidades e faculdades guarda relação direta com a formação de seu corpo docente. O Norte concentra apenas 3,5% dos cursos de mestrado e doutorado. São parcos quatro mil profissionais com essa qualificação, enquanto o Sul e o Sudeste detêm 40 mil dessa massa pensante.
Por via de consequência, em termos proporcionais, as oportunidades são infinitamente menores para os habitantes das regiões setentrionais. E os que conseguem passar na seleção terão professores com menos títulos, ficando os pouquíssimos doutores reservados para os cursos de pós-graduação strictu sensu, igualmente ínfimos e de difícil acesso.
O resultado é uma tremenda injustiça contra a população local das regiões menos favorecidas no tocante ao preenchimento de cargos públicos. Um olhar sobre o mapa de lotação de uma capital dessas áreas nos mostrará uma considerável imigração. Boa parte dos que ocupam os assentos nas repartições provém de fora. Em primeiro plano, nada errado. Porém, numa visão mais aprofundada, veremos que se trata mesmo de uma terrível injustiça contra essas populações. E isso porque essa desigualdade resulta do processo histórico a que a região Norte foi e ainda é submetida.
A situação se agrava quando olhamos a lotação de cargos de Estado, como de juízes, promotores, procuradores etc. Nessa hora, a injustiça social contra o Norte fica evidente. A população local é praticamente zero em alguns lugares. Quando muito, um ou dois cidadãos da terra conseguem vencer suas próprias limitações. Por via de consequência, as decisões de uma terra podem estar sempre em mãos alheias.
Com merecida justiça, há ocupantes desses importantes cargos que vestem a camisa do povo que os recebe e dá emprego. Mas, é inegável que muitos tratam essas regiões com espírito colonialista: dos estados das regiões Norte e Nordeste querem apenas o tempo necessário para remoção para suas próprias terras.
Neste sentido, necessário uma lei que garanta um mínimo dos cargos públicos para candidatos naturais dessas regiões.
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RUI RAIOL é escritor (www.ruiraiol.com.br)
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