segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Cenas do verão de 2002


O atual momento político do candidato José Serra é bastante delicado. Lembra Nosso Guia em 1994, sem discurso e perspectiva. Não é sem propósito a afirmação recente de Rodrigo Maia, presidente dos Democratas, quanto à inevitabilidade do desastre. Serra cometeu um erro pueril quando insistiu em marchar sozinho, levou o PSDB a criar muitas dificuldades à forma excludente como continua tratando suas mais influentes lideranças.
Serra tem que provar ser um bom cavaleiro e saber se manter em cima de uma sela. O corcel indomável da política em que cavalga está para jogá-lo ao solo. A história da humanidade é pontilhada pelo exemplo de pessoas que ousaram até os limites extremos para combater o bom combate. Aliás, muitos deles, inúmeros, são celebrados como heróis no mundo todo. Serra foi ousado em um passado recente, no regime de exceção - e por que não continua a ousar? O candidato tucano à Presidência mudou de estilo e decidiu partir para o corpo a corpo com os eleitores de maneira a tentar reverter os números negativos nas pesquisas.
O Ibope visual, na avaliação de Carlos Augusto Montenegro, diretor do Ibope, sobre os desempenhos dos presidenciáveis no horário eleitoral pela televisão, foi contundente: "O programa de Serra é bom. O de Dilma Rousseff é espetacular".
Tudo leva a crer que estamos assistindo ao déjà-vu de Serra. A sucessão nos remete ao verão de 2002: o tucano está sem discurso, sem dinheiro e, o que é pior, sem aliados. Agora, com uma grande diferença: a sensação de derrota iminente chegou mais cedo que o previsto. Estamos no final de agosto, a um mês das eleições, e a campanha tucana parece enfraquecer-se em praça pública. Falta estratégia. Nada funciona satisfatoriamente.
No debate promovido pelo portal UOL na quarta-feira (18), Serra optou pela crítica agressiva e direta a Dilma e ao PT, mas foi aconselhado por seu marqueteiro, Luis Gonzales, a ser mais contido. A constatação de Gonzales era óbvia: quanto mais bater, mais riscos de parecer desesperado. Qual a alternativa? Toda vez que se apresentou como o "pós-Lula", o tucano escorregou e perdeu votos. Quando faz o estilo "paz e amor", tem sido o de aumentar a raiva da parcela de seu eleitorado visceralmente antipetista. Nas últimas duas pesquisas divulgadas, aumentaram consideravelmente as chances de a adversária vencer no primeiro turno.
Trata-se, portanto, de reprisar e ver que Serra vive o mesmo drama do Nosso Guia em 1994, quando o êxito imediato do Plano Real acabou com qualquer chance do petista. Vivemos um clima semelhante, uma espécie de não-eleição na qual os brasileiros, satisfeitos com o País e suas vidas, estão refratários a candidaturas oposicionistas.
Por si, a conjuntura seria suficientemente difícil para a oposição, mas ela faz questão de se autoflagelar. A favela cenográfica no primeiro programa eleitoral de Serra na tevê mostrou-se um desastre. Serviu, única e exclusivamente, para reforçar a impressão de que o PSDB é um partido, digamos assim, das "massas bem nascidas".
Do Norte ao Sul, os aliados e simpatizantes do PSDB optaram por esconder o presidenciável nos programas eleitorais, quando não exibem imagens do Nosso Guia. O Estado mais emblemático talvez seja Pernambuco. Sergio Guerra, presidente do partido e um dos coordenadores da campanha nacional, optou em seu programa a deputado federal aparecer ao lado de Geraldo Alckmin. Ao tentar explicar a ausência de Serra, Guerra produziu mais uma peça cômica: "Minha campanha é a mais tucana de todas". Ao fim e ao cabo, Dilma nem vai precisar se esforçar muito.

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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com

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