O artigo a seguir, sob o título acima, está no Consultor Jurídico, está no Consultor Jurídico.
Foi escrito por Vladimir Passos de Freitas, ele próprio juiz federal.
Juiz federal de carreira, seja bem dito, e atualmente desembargador federal aposentado.
Vale a pena ler.
É uma exposição que oferece, na medida, um cenário perfeito das distorções que perduram no sistema de provimento dos cargos disponíveis nos tribunais brasileiros.
Distorções que incluem esse quinto constitucional, uma excrescência, como vocês sabem.
Excrescência constitucional, mas sempre excrescência.
Boa leitura.
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A aposentadoria do ministro Eros Grau, que completa 70 anos em 19 de agosto, foi anunciada pela mídia e, segundo consta, quatro nomes, com currículos inegavelmente expressivos, despontam para sucedê-lo (Folha de São Paulo,17.6.2010, A10). Portanto, está aberta a disputa pela vaga no STF. Nada mas natural. Afinal, trata-se do cargo máximo na hierarquia do Poder Judiciário. Ocupá-lo é uma honra destinada apenas a 11 brasileiros, em uma população de quase 200 milhões de habitantes.
Dizia-se que o cargo de ministro do Supremo nem se pede, nem se rejeita. Não é mais assim. Atualmente se pede e não se rejeita. O pedir, aí, faz-se pelo apoio de terceiros, que levam o pleito a quem decide (Presidente da República) ou a quem possa influenciá-lo. E vale tudo, desde políticos de prestígio até àquela idosa professora do ensino fundamental (ex-primário).
Os órgãos de cúpula do Poder Judiciário variam conforme o país. Uns possuem um Supremo Tribunal (p. ex., EUA, México e Argentina), outros dividem o poder entre uma Corte Superior (com juízes de carreira) e outra Constitucional, fora do Judiciário (p. ex., Itália, Espanha e Colômbia).
No Brasil, os juízes de carreira sempre fizeram parte da cúpula do Judiciário. No Império, só eles julgavam no Supremo Tribunal de Justiça, que era “composto por Juízes Letrados, tirados das Relações por suas antiguidades” (Constituição de 1824, art. 163). Proclamada a República, adotou-se o modelo norte-americano. O Presidente indica e o Senado aprova ou rejeita (CF de 1891, art. 48, item12). A aprovação é a regra. Mas, em 24.9.1894 o Senado rejeitou o médico Barata Ribeiro, por estar ausente o requisito do notável saber jurídico.
Mas, afinal, o que se espera de um ministro do STF? A meu ver, deve ter os predicados que se exigem de todos os juízes, e aqui repito Edgard Moura Bittencourt: “Do conjunto de virtudes (algumas das quais apenas aparentemente incompatíveis entre si), como a independência, a humildade, a coragem, o altruísmo, a compreensão, a bondade, a brandura de trato a par com a energia de atitudes, o amor ao estudo e ao trabalho, - dimana a personalidade positiva do juiz. A elas, como é óbvio, não adiciono a honestidade, que não é virtude, senão mero ponto de partida, essencial como o diploma ou a capacidade civil: o desonesto pode estar vestido com uma toga, que não cobrirá um magistrado mas uma repelente ferida social e moral” (O Juiz, LEUD, 1982, p. 30).
Um Juiz Supremo, como chamam os peruanos aos da Corte, deve ter as virtudes apontadas por Bittencourt e, ainda, ser uma pessoa que conheça seu país, ter vasta cultura geral e jurídica, dominar outros idiomas, ter habilidade política (não significa partidária) e - ainda que possa surpreender - força física para suportar a descomunal carga de trabalho que lhe é submetida.
Pois bem, na história republicana sempre se mesclou a composição do STF, dele fazendo parte juízes de carreira ou não. Sempre foram nomeados juristas de origens diversas. Advogados, agentes do Ministério Público, Professores e, obviamente, também Juízes de carreira. A obra de Leda Boechat Rodrigues, História do Supremo Tribunal Federal, Ed. Civilização Brasileira, é de consulta obrigatória. Vejamos.
Pedro Lessa, advogado e professor em São Paulo, tomou posse como ministro do STF em 20.12.1907. Carvalho e Albuquerque, Juiz Federal no Rio de Janeiro, foi nomeado em 1917. Bento de Faria, que foi Delegado de Polícia, Promotor e Advogado no Rio de Janeiro, foi nomeado em 4.8.1925. Castro Nunes, Juiz Federal e depois Juiz de Direito (quando extinta a Justiça Federal em 1937) no então Distrito Federal, foi nomeado em 10.12.1940. O mineiro Bilac Pinto foi Deputado e Embaixador, tomando posse no STF em 1970. Aliomar Baleeiro, parlamentar baiano, foi nomeado ministro em 1965. São nomes que dispensam comentários.
A escolha de profissões diversas foi a adotada nas mais diversas fases da vida política do país, na democracia e na ditadura. E sempre deu certo. Com foco apenas em Juízes de carreira, em tempos mais recentes, muitos brilharam no STF. Por exemplo, os magistrados estaduais Thompson Flores (RS) e Sydney Sanches (SP) e os juízes federais Carlos Velloso (MG) e Néri da Silveira (RS).
Todavia, nos últimos anos o equilíbrio vem se rompendo. Os Juízes de carreira vêm sendo esquecidos, para não dizer rejeitados. Mais de 100 anos de tradição são deixados de lado, sem que o fato seja comentado, discutido ou noticiado (louvável exceção a Min. Eliana Calmon, do STJ). Mire-se uma foto dos 11 integrantes do STF e nela se verá apenas um magistrado de carreira, o ministro Cezar Peluso.
Óbvio que os outros 10 ministros também são pessoas de grande valor. Para ficar apenas no decano, ministro Celso de Mello (MP/SP), que dignifica a Suprema Corte desde 1989, a cultura jurídica se alia à cordialidade no tratado e à simplicidade. E assim também os demais, cada um com suas características pessoais.
Mas a questão não é esta. É simplesmente saber por que os juízes de carreira foram esquecidos nos últimos anos. Nas dezenas de Tribunais de segunda instância, e mesmo no primeiro grau, há pessoas de excelente preparo intelectual, com titulação acadêmica (doutorado), experiência de vida, de Justiça e amor pela profissão. No entanto, não são lembrados. Quiçá porque não se submetem a andar pelos corredores do Congresso ou na Esplanada dos Ministérios a alardear suas virtudes e pedir apoio. A profissão dá-lhes o recato, a timidez. E por isso são esquecidos. Desestimulados.
Há solução? Sim, sem dúvida. Basta fazer o que sempre se fez, desde o Império: indicar também magistrados de carreira para o STF. Ou aprovar a EC 434/09 do Dep. Flávio Dino, que propõe lista sêxtupla, da qual 1 terço deve ser de juízes.
É preciso valorizar aqueles que se submetem a concurso, percorrem a carreira degrau por degrau, passam por lugares distantes, formam o conhecimento prático no dia a dia, ouvindo testemunhas, conciliando, solucionando conflitos, prendendo e soltando. Enfim, os que conhecem a magistratura, suas dificuldades, seus defeitos e suas qualidades.
Se continuar o sistema de exclusão dos magistrados de carreira, doravante nos discursos de posse de Juízes Substitutos o Desembargador que for saudá-los deverá anunciar: "Caros empossandos, limitem suas legítimas aspirações, restrinjam seus sonhos, não alimentem a ilusão de chegar à Suprema Corte, pois o Brasil é um país que não valoriza seus juízes".
Foram esquecidos porque merecem o esquecimento!
ResponderExcluirO nobre jornalista insiste em combater o quinto constitucional, mas esquece que o Poder Judiciário funciona mal em nosso país - e ponha mal nisso! -, só melhorando um pouquinho depois que o CNJ, instituído pela Emenda Constitucional nº 45/2004, passou a fiscalizar mais de perto a atuação da magistratura nacional. E o CNJ, como se sabe, é formado por juízes e advogados.
ResponderExcluirNão tenha dúvida, nobre jornalista, de que os custos dos serviços e produtos no Brasil ficam mais elevados em razão da morosidade do Judiciário, um poder constituído, em sua esmagadora maioria, por juízes de carreira ou togados, mas, verdade seja dita!, ainda sem a compreensão necessária de que prestam um serviço à comunidade, aliás, um serviço de alta relevância político, econômica e social, que é dizer o Direito.
O quinto constitucional oxigena os tribunais, impede que o corporativismo funcional torne-os ainda mais insuscetíveis de mudanças e de aprimoramento.
Aliás, o Direito não pode deve ficar adstrito apenas aos juízes e advogados porque ele, o Direito, não dá conta mais dos casos difíceis (hard cases) que lhe são submetidos, necessitando recorrer à política, teoria dos jogos, estatísticas, teoria da escolha pública, etc.
Tribunais constituídos unicamente por juízes de carreira são, na verdade, um perigo para a sociedade porque o Direito é cada vez menos instrumental ou técnico e cada vez mais político, daí a atuação do STF ser caracterizada como tendente à chamada judicialização da política (na verdade, o STF repete a trajetória da Suprema Corte americana).
Então, penso, humildemente, que seja hora de o ilustre jornalista rever os conceitos que possui acerca do quinto constitucional.
POR QUE NO LUGAR DE SE PREOCUPAR COM O QUINTO CONSTITUCIONAL OS EXCELENTÍSSIMOS JUÍZES NÃO LUTAM PARA MUDAR A LEI QUE OS BENEFICIA QUANDO SÃO AFASTADOS POR ILEGALIDADE E PASSAM A RECEBER APOSENTADORIA PROPORCIONAL?
ResponderExcluirISSO, SIM, SERIA UMA DISCUSSÃO INTERESSANTE! AFINAL, NO PLANETA TERRA, ESPECIFICAMENTE NO BRASIL, O TRABALHADOR, SEJA PÚBLICO OU DA INICIATIVA PRIVADA, SÓ RECEBE ESSE TIPO DE APOSENTADORIA QUANDO ANTES DE COMPLETAR 35 ANOS DE SERVIÇO E 35 ANOS DE CONTRIBUIÇÃO FICA DOIDO.
QUEM SABE O ARTICULISTA, CRAQUE EM PREVIDENCIÁRIO, NÃO LEVANTA A BANDEIRA PELO FIM DESSE TIPO DE APOSENTADORIA INDECENTE?
DUVIDO! ELE PODE ATÉ DIZER QUE DISCORDA MAS NÃO FAZ NADA PARA MUDAR!
A propósito do comentário das 11:01, o senador Arthur Virgílio disse que lutará pela aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 89/2003, que acaba com a impunidade de juiz corrupto, cuja punição hoje consiste apenas em ser aposentado.
ResponderExcluir“Mais um juiz – assinalou o senador – por prevaricar ou ser acusado de corrupção, acaba de ser aposentado. Sei que o Conselho Nacional de Justiça, onde há figuras ilustres, de reputação ilibada, não pode, legalmente, ir além disso.”
“Juiz corrupto – acrescentou – é aposentado com seus vencimentos, depois, vira advogado, fica com aquela polpuda aposentadoria e vai ganhar rios de dinheiro fazendo advocacia. Fazendo chicana, certamente. Ou fica na praia, porque ganha bem para isso e se aposentou sem merecer.”
Para o senador, isso é inaceitável. Se um funcionário público furta ou desvia dez litros de óleo diesel e é apanhado, é demitido a bem do serviço público, sem nenhuma indenização. “O juiz não, ele é tratado a pão de ló”, frisou.
“Alegam – disse Virgílio – que juiz não pune juiz com demissão. Por que não? No Itamaraty, de onde vim, diplomata expulsa diplomata quando tem que expulsar, militar pune militar. Por que com o juiz haveria de ser diferente?”
O líder tucano prometeu pôr a Casa em brios, conclamando-a a aprovar a PEC, que já se encontra na pauta da Ordem do Dia. Não aceita o argumento de que não se deve mexer com magistrados porque amanhã ou depois se pode vir a ser julgado por eles.
Por que teria de ter medo?”, perguntou. “Por que haveria de ser alvo de represália de juiz sério? Juiz bandido, imagino, vai fazer represália com quem quer que seja. Por que juiz tem de ser intocável? Intocável é o juiz sério, não o que prevarica, não o corrupto.”