domingo, 20 de dezembro de 2009

Cabanagem agora é o endereço da morte

GUTO LOBATO, do AMAZÔNIA:

Medo da criminalidade, carência de serviços fundamentais e uma sensação de completo abandono por parte do poder público. O cotidiano dos moradores do bairro da Cabanagem, em Belém, não difere do vivido por quem reside em outras áreas periféricas da capital. O grande diferencial está na crescente de violência que se tem enfrentado no local nos últimos meses. Foco da ação de traficantes de grande porte, o bairro registra uma média de seis homicídios por mês, segundo dados da Polícia Civil – e boa parte desses crimes possui características de acerto de contas. Colaboram nessa equação desoladora de insegurança ruas mal pavimentadas, áreas de invasão que não param de crescer e um reduzido efetivo policial para cobri-las.
Com uma população de baixa renda estimada em pouco mais de 20 mil habitantes, a Cabanagem é mais um fruto da expansão desordenada que se configurou no trajeto entre Belém e o distrito de Icoaraci nos últimos 20 anos. Delimitado pelas rodovias Augusto Montenegro (a oeste) e Mário Covas (a leste), o bairro faz fronteira com Parque Verde, Mangueirão e Coqueiro, outros que possuem histórico de grande vulnerabilidade socioeconômica.
Um rápido passeio pelas travessas que cortam a principal via de acesso do bairro, a avenida Independência – inaugurada em 2004 e que promete ser a nova saída de Belém rumo à região metropolitana, com o projeto Ação Metrópole –, mostra a desconfiança com que moradores recebem quem não é da área. Por volta de meio-dia, as ruas estão vazias e sem muito movimento. Os estabelecimentos comerciais e casas, mesmo quando ficam à beira da avenida, são todos gradeados. Uma exceção é a rua Damasco, paralela à Independência, onde funciona a feira do bairro. Mas comerciantes dificilmente se expõem falando do assunto à imprensa.
Relato - Com certa relutância, uma comerciante de 73 anos topou falar com a reportagem dentro do armarinho que administra. Pedindo para não ser identificada, a moradora disse viver com o marido há 23 anos na Cabanagem e ter se adaptado à criminalidade. 'No outro lugar em que a gente morava, dava para pôr as cadeiras na frente de casa e ficar lá, com os vizinhos. Aqui, temos que nos recolher depois das sete da noite', relata. 'Vez ou outra aparece alguém morto, ouvimos trocas de tiros, sirenes da polícia. Botar a cara para fora de casa é arriscar a vida', completa.
Apesar disso tudo, ainda se poderia dizer que a comerciante não está na pior das situações - seu estabelecimento fica a poucos quarteirões da delegacia de Polícia Civil do bairro. O problema é que, após sucessivas fugas e problemas infraestruturais, a unidade acabou por funcionar em 'horário comercial'. Segundo ela, isso impede que a segurança no local melhore efetivamente. 'Esse é o grande problema. Poderíamos até dizer que a polícia nos protege estando aqui perto, mas a delegacia fecha de noite. Não tem lei aqui depois que anoitece', lamenta.

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