Independência e dignidade não se medem com café da manhã

Um café da manhã – um simples café da manhã – oferecido pela governadora Ana Júlia (na foto) a blogueiros, que assim teriam a oportunidade de questioná-la sobre temas de interesse público, abriu uma fenda, ou quem sabe uma cratera, entre os fatos e a capacidade que todos temos de alcançar os seus significados.
Quais são os fatos?
São poucos.
Primeiro, foi feito um convite, destinado a vários blogueiros, inclusive o editor deste blog.
Segundo, a pauta do encontro estava expressa no convite: “assuntos de interesse do Estado e da população e as ações do governo voltadas para o desenvolvimento do Pará.”
Terceiro, o encontro seria, é claro, uma entrevista coletiva, na qual a governadora certamente exporia as ações de seu governo, e os blogueiros presentes a interpelariam da forma que melhor lhes conviesse.
Quarto, o que os blogueiros receberam foi um convite, não uma imposição; foi um convite, não uma intimação inapelável; foi um convite, não foi uma sentença de morte.
Quinto, entre os convidados, alguns foram, outros não quiseram ir.
Pronto.
Foi só isso.
Ou melhor, seria só isso.
Mas não foi.

Ofensas, ofensas, somente ofensas
O que temos visto, desde a segunda-feira até agora?
Temos lido coisas inacreditáveis.
Tanto os que foram ao café da manhã como os que não foram ao café da manhã estão sendo alvo de ofensas as mais torpes, as mais porcas, as mais repugnantes entre todas as que já lemos recentemente na blogosfera do Pará.
Aqui neste blog, expôs-se claramente o motivo da ausência.
E o motivo apontado foi básica e essencialmente um: a convicção de que entrevistas coletivas – com ou sem café da manhã – são improdutivas.
Ao mesmo tempo, o editor deste blog saudou como positiva a iniciativa da governadora em reunir os blogueiros.
Basicamente, foi isso.
Pronto. Foi apenas isso.
Não se ofendeu ninguém.
Não se recriminou ninguém.
Não se condenou ninguém.
Mas as explicações oferecidas por este blog não foram suficientes para desestimular vários comentários ofensivos e absolutamente impublicáveis. Por isso é que, se vocês forem ver na caixinha da postagem, há uns quatro ou cinco, se tanto.
Por que as ofensas?
Porque o editor não foi ao café da manhã.
Não foi e ainda fez questão de destacar como positiva a ideia. Mais: desejou um bom encontro a todos os blogueiros que atendessem ao convite.
Tanto é que se escreveu aqui:

Ainda que ausentes, acreditamos que este é um primeiro – e importante – passo para que a transparência, sempre tão almejada, seja a marca irremovível das relações permanentes entre governantes e a sociedade que eles governam.
É isso!
E um bom café da manhã à governadora Ana Júlia e aos colegas blogueiros que com ela estiverem nesta manhã.

Pronto.
Foi só isso.
Mas acabou não sendo só isso, repita-se.
Porque, além das ofensas destinadas a quem não foi, como ao pessoal aqui da redação, ainda choveram ofensas aos colegas que foram ao encontro, sob a alegação de que supostamente perderam a independência, porque cooptados pelo governo Ana Júlia.

Indignidade sem limites
Isso é uma indignidade.
É de uma baixeza moral sem tamanho fazer juízos sobre o caráter dos outros apenas porque atenderam ou deixaram de atender a um convite como o formulado pela Secretaria de Comunicação do governo do Estado.
E mais do que uma indignidade, é uma ingenuidade incomparável imaginar que um jornalista, um blogueiro – seja seu blog de que natureza for – vai se tornar mais ou menos independente porque foi ou deixou de ir a uma entrevista coletiva com a governadora.
A independência de um jornalista não se mede por um café da manhã.
A independência de um blogueiro não se mede por duas tapioquinhas e dois copos de suco de laranja.
A independência de um blogueiro e de um jornalista não se mede por dois pães de queijo.
Não é necessário um café da manhã com um governador seja quem for para que blogueiros – jornalistas ou não – ofereçam demonstrações explícitas de maior ou menor adesismo a nacos de poder.
Isso parece ser tão claro e objetivamente compreensível como, da mesma forma, é claro e objetivamente compreensível que as torpezas disseminadas nos últimos dias contra os que se fizeram ausentes atendem ao propósito, simplesmente, de quem pretende ser torpe.
E mais ainda: é inacreditável que os colegas que foram ao café da manhã estejam sendo confundidos com desocupados ou com pessoas que receberam o convite para comparecer ao Palácio dos Despachos como se tivessem sido aquinhoados com um prêmio milionário da mega-sena.
Será que não se respeitam as opções de cada um nesta terra?
Será que voltaremos aos tempos de patrulhamentos – odiosos, como todo patrulhamento?
Será que não se pode travar debates em que as ideias briguem, e não as pessoas?

Aos bloqueiros, com respeito e consideração
É preciso, por tudo isso, dizer expressamente aos blogueiros que foram ao café da manhã o que pensamos deles.
Carlos Barreto, caro companheiro. Você, que foi ao café da manhã, continua a merecer todo o nosso respeito e a nossa consideração. E estamos certos de que Flanar, que você e outros flanares fazem tão bem, continuará a ser uma referência na blogosfera.
Marcelo Marques, Bacana dos mais bacanas. Você, que foi ao café da manhã com Ana Júlia, continua a merecer a nossa leitura e a nossa admiração pelo espaço que você tem conquistado com muito trabalho. Aliás – e sabes disso, Marcelo, porque já conversamos a respeito -, se você é notado é porque não é uma tapioquinha azeda. Ao contrário, com seu trabalho, você vale exatamente o espaço que conquistou. E não é um espaço qualquer, não.
Ércio Bemerguy (Mocorongo). Você, que foi ao café da manhã, está sentindo na pele o que é ser atirado na sarjeta de acusações despropositadas, injustificadas, sem sentido. A nossa solidariedade.
Milton Pereira e Rui Santana (Ananindeua em Debates), Jorge Paz Amorim (Na Ilharga) e Luiz Paulo (Observatório Eleitoral). Vocês foram ao café da manhã. Fiquem certos: acreditamos que, depois disso, os blogs de vocês ainda ficarão melhores.
Miguel Oliveira (Estado), José Carlos Lima (Blog do Zé Carlos) e Wagner Okasaki (Belenâmbulo). Vocês foram ao café da manhã. Saibam: em nada, absolutamente nada isso haverá de diminuí-los.
Carlos Kayath. Você foi ao café da manhã. Olhe, Carlos, o seu CJK é leitura obrigatória – pela serenidade, pela elegância, pela moderação, pela boa informação, por tudo, enfim... Menos, é claro, por suas preferências rubro-negras (rsss). Mas isso é um outro papo; quem sabe, até para um café da manhã. Tenha o nosso respeito e a nossa consideração.
Franssinete amiga.
Você ficou por último, mas não é a menos importante dessa lista (last but not least, como se diz).
Entre os convidados que foram ao encontro com a governadora, você, Franssi, era a única mulher. E por mais incrível que possa parecer, você tem sido o alvo predileto das maiores vilezas, entre todas e tantas que têm sido disseminadas por aí.
Imagino que ninguém, entre os ofendidos por terem ido ou não a esse café da manhã, tenha sido tão ofendido na sua honra como você.
Estamos certos de que você é inteligente e madura para proceder como deve, a fim de reparar esses gravames.
Independentemente disso, todavia, saiba que você merece o nosso carinho, a nossa distinção, o nosso apreço e o nosso respeito pela dignidade com que você se comporta – na sua profissão, no seu ambiente de trabalho, entre os seus amigos e no seio de sua família.
É isso!
E até outro café da manhã.
Quem quiser, vai.
Quem não quiser, não vai.
Não é tão simples?