Decisões judiciais precisam ser cumpridas.
Devem ser cumpridas.
Para que sejam cumpridas, precisam ser inteligíveis, compreensíveis, claras.
Claríssimas.
Não podem guardar contradições consigo mesmas e muito menos com a lógica.
Não podem ser omissas.
Não podem ser obscuras.
Não podem ser incongruentes com a realidade.
Se não forem tudo isto – claras, inteligíveis, compreensíveis, lógicas -, como haverão de ser cumpridas senão de forma atropelada?
Os cidadãos – que o Judiciário costuma chamar respeitosa e pomposamente de jurisdicionados – que o digam.
O editor deste blog que o diga.
Há poucos dias, chegou por aqui um e-mail.
É assinado pelo diretor de Secretaria em exercício, Felipe Fonseca, de ordem da juíza Maria das Graças Alfaia Fonseca, titular da Vara de Crimes Contra Crianças e Adolescentes.
O expediente é curto.
Tem apenas sete linhas.
Informa que, por determinação da meritíssima magistrada, o blog está proibido de divulgar informações sobre processo em que uma criança é envolvida.
O blog, segundo a juíza, não pode mencionar relações de parentesco entre a vítima e o acusado, não pode divulgar o nome e as iniciais da suposta vítima, não pode divulgar o teor dos depoimentos das testemunhas, da vítima “ou qualquer outro dado do processo, sejam os despachos, deliberações em audiência ou decisões interlocutórias deste juízo, consoante o que preceitua o art. 143, parágrafo único do ECA.”
Diga-se, antes e acima de tudo, que o blog, há mais de três meses, não noticia absolutamente nada sobre o processo em referência, cujos dados mais precisos não podem ser expostos aqui, em obediência à determinação da juíza.
E nas vezes em que noticiou, o blog tratou o assunto com absoluta objetividade.
E quando noticiou, entendeu que deveria fazê-lo porque o assunto é de interesse público e foi levado, inclusive, à Comissão Parlamentar de Inquérito, na Assembleia Legislativa do Estado.
Nas postagens aqui feitas, nenhuma contém juízo de valor sobre nada e ninguém.
Mas isto, no caso, é o de menos.
O certo é que o editor do blog é obediente.
E não pretende furtar-se ao cumprimento da determinação emanada da meritíssima magistrada.
Aliás, já está cumprindo-a.
Mas precisa compreendê-la.
Precisa alcançar a sua lógica, a sua razoabilidade.
Por quê?
Porque o processo a que Sua Excelência a magistrada se refere está disponível para consulta pública, no site da Justiça Estadual.
A consulta, repita-se e trepita-se, é pública.
Se a consulta é pública, é de evidência solar que o processo não corre sob segredo de justiça.
No processo, evidentemente, é omitida – correta e legalmente – a identidade da criança. E diga-se: em nenhuma postagem aqui no blog, foram mencionadas sequer as iniciais da criança, tudo de acorco com o ECA, portanto.
Mas o processo, enfim, está lá no site para todo mundo ver e ler o teor dos despachos, das decisões interlocutórias e tudo o mais.
Então, vamos simular a seguinte situação.
Aqui no Espaço Aberto, por determinação de Sua Excelência a juíza Maria das Graças Alfaia Fonseca, está terminantemente proibido divulgar fatos – apenas fatos, sem ilações, sem juízo de valor, apenas e tão somente fatos – referentes a este processo, como despachos e decisões interlocutórias.
Mas todos os cerca de 1,4 milhão de habitantes de Belém, ou mesmo os 180 milhões de brasileiros podem acessar a internet, visitar a página da Justiça Estadual, encontrar o link de consultas processuais, digitar os dados básicos do processo – como o nome de uma das partes – e chegar à integra de despachos, decisões interlocutórias etc.
Há alguma lógica nisto – entre a determinação judicial e o contexto em que ela deverá ser seguida?
Há nisto alguma congruência, alguma sintonia com a razoabilidade?
Sua Excelência a juíza, ela própria, pode ir lá e consultar o processo.
Sabe Sua Excelência que milhões de pessoas podem, se quiserem, ter acesso a toda a movimentação do processo em referência - inclusive aos despachos e às decisões interlocutórias -no próprio site da Justiça Estadual?
O blog, conforme já disse, é obediente.
E ainda que discorde dessa decisão, está cumprindo-a.
Mas vai pedir maiores esclarecimentos.
Pedirá esclarecimentos à Corregedoria Metropolitana do Tribunal de Justiça do Estado.
Vai mandar um e-mail pra lá.
De qualquer forma, é preciso fazermos ver à Justiça – sempre e sempre – de que a má distribuição da justiça não é justiça.
A má aplicação da lei não é justiça.
Uma determinação judicial que deixa o cidadão – ou jurisdicionado - confuso – é causa de insegurança.
Ou não?
A Corregedoria do Tribunal é que vai dizer.
Esperemos que se manifeste o quanto antes.
Por que a consulta à Corregedoria?
Primeiro, porque não está claro em que circunstância a juíza tomou a decisão – se foi provocada pelo Ministério Público, pela defesa do acusado, se houve algum incidente processual – enfim, o ofício não deixa entrever nada disso.
E segundo, porque o inusitado da decisão guarda estreita vinculação com o fato, indesmentível, de que o site da Justiça Estadual disponibiliza consulta pública, inclusive sobre o processo em referência.
Em todo o caso, é imprescindível a manifestação da Corregedoria para que as decisões judiciais possam ser cumpridas com a certeza, por parte de quem as cumpre, de que está cumprindo certo.
Tanta coisa importante para a nossa justiça se preocupar...
ResponderExcluirA justiça deveria querer a imprensa como parceira para ajudá-la a prevenir esses crimes sexuais que correm contra as crianças e adolescentes.
Blog,
ResponderExcluirIntimação por e-mail?
Você foi citado?
Você recorreu?
Anônimo, a rigor, não fui citado porque, graças a Deus, não estou sendo processado.
ResponderExcluirE não recorro porque nem sei em que circunstância ocorreu a determinação da magistrada.
Trata-se apenas de um ofício mandando evitar a publicação das informações. Mas o processo a que o ofício se refere é o do próprio acusado.
Uma coisa esquisita, portanto.
Abs.
Paulo, isso é muito estranho. Como se sabe, o Judiciário não intima e muito menos comunica determinações em juízo através de e-mail. Você está certo em pedir esclarecimentos à Corregedoria Metropolitana, diante do inusitado da situação. Sugiro que você também entre em contato com a juíza, que pode nem saber que seu nome foi usado indevidamente e merece ser informada.
ResponderExcluirEu duvido muito que ela tenha tomado tal decisão.
Gratíssimo pela orientação, Franssi.
ResponderExcluirAbs.
A Franssi disse tudo e mais um pouco.
ResponderExcluirTambém nunca soube de intimação via e-mail (por sinal, é nulo!). Verifique isto, Paulo e nos conte.
Acho que você foi vítima de um engano... em todos as possibilidade e em todos os sentidos!
Será que a nossa justiça já se equipara a da Inglaterra?
ResponderExcluirEntenda lendo aqui: http://yudicerandol.blogspot.com/2009/10/intimacao-judicial-via-twitter-e-valida.html
PB, não existe essa modalidade de comunicação, aviso, intimação ou ofício pelo TJE. Pelo menos por enquanto, não. Isso deve ter sido uma forma de ameaça velada, por alguém sem escrúpulos. Guarde o e-mail que mediante o cabeçalho dele se poderá verificar o IP e localizar o individuo que usou o nome de terceiros irregularmente e está passível de responsabilização.
ResponderExcluirAbs,